A história se repete. Como em 2003, os Mighty Ducks se valem de um jogo coletivo sólido, especialmente na defe-sa, para conter seus adversários. E conseguem vitórias que, se não são um primor de estética, conseguem o objtivo, que é marcar mais gols do que o adversário.

É claro que, mesmo jogando com um esquema assim, sempre pode haver um lampejo de um jogador do outro time ou mesmo alguma falha individual, que faz o esque-ma ir por água abaixo em um lance. É aí que entra em cena o goleiro que, em grande fase, pára tudo lá atrás.

Em 2003, Jean-Sebastién Giguere cumpriu muito bem esse papel, carregando o Anaheim até as finais, quando sucumbiram em sete durís-simos jogos frente ao New Jersey Devils. A prova de que ele foi o gran-de responsável pelo feito foi o Troféu Conn Smythe conquistado por ele, mesmo fazendo parte do elenco do time derrotado.

A performance naqueles playoffs transformou-o em ídolo instantâneo na Califórnia, mas as grandes atuações ficaram confinadas naqueles distantes playoffs. Não que ele fosse um desastre, mas ele não estava mais ganhando jogos praticamente sozinho. O crédito que ele tinha du-rou até o quinto jogo da série da primeira fase contra os Flames.

A série estava empatada, e Giguere tinha sido o titular nas três parti-das anteriores (uma contusão o tirara do jogo 1). Nos seus oito primei-ros chutes a gol, o Calgary marcou três vezes, o que levou o técnico dos Ducks, Randy Carlyle, a substituir seu goleiro. Entrou o desconhecido Ilya Bryzgalov, dono de um currículo com dois jogos na NHL antes desta temporada, com uma campanha nada espetacular de 13-12 em 31 jogos em 2005-06.

E não é que ele resolveu?

Naquele jogo, as 19 defesas em 19 chutes de pouco adiantaram, já que o ataque produziu apenas dois gols e não conseguiu virar o jogo. Mas Bryzgalov não se intimidou e garantiu lá atrás no jogo seguinte, parando 21 dos 22 chutes disparados contra ele. O Anaheim venceu por 2-1, levando a série para o jogo 7 em Calgary.

Lá, mais uma vez Bryzgalov não negou fogo, parando tudo. Nem foram tantos chutes assim — 22, fruto do já citado jogo defensivo eficiente da equipe —, mas o shutout valeu da mesma maneira. E valeu mais ainda porque deu a classificação aos Ducks, que seguiram embalados para enfrentar o Avalanche.

"Estavos jogando firmes como equipe", explica Todd Marchant. "Joga-mos o básico e, ao mesmo tempo, tentamos dar ao Bryz a chance de ver o disco."

Nesta série, os Ducks entraram como favoritos, é verdade, mas nin-guém poderia esperar um domínio tão absoluto como nas três primeiras partidas. E, mais uma vez, Bryzgalov foi o grande responsável. Parando todos os 51 chutes desferidos contra ele nas duas primeiras partidas, conseguiu mais dois shutouts, só sofrendo o primeiro gol da série no final do primeiro período do jogo 3.


OLHO NO DISCO Bryzgalov faz parecer simples (AP - 06/05/2006)

Seus 249 minutos e 15 segundos de shutout só ficaram atrás dos 270 minutos e 8 segundos de George Hainsworth, do Montreal, nos playoffs de 1930. São, pelo menos, o recorde entre goleiros novatos. E também superam os 217 minutos e 54 segundos conseguidos por Giguere nos playoffs de três anos atrás como recorde do Anaheim nos playoffs.

E se alguém perguntasse a Bryzgalov antes dos playoffs qual foi seu jogo mais memorável, provavelmente a resposta seria uma vitória por 5-4 na prorrogação contra o mesmo Colorado, em 22 de março, quando ele substituiu Giguere, que tinha sofrido três gols em 11 minutos, ainda no primeiro período e parou 18 de 19 chutes. É, você pode chamar o que está acontecendo agora de déjà-vu.

"Eu trabalho duro", conta o goleiro, fazendo a sua proeza parecer tão normal quanto o café que você toma em algum intervalo na sua empre-sa. "Eu sempre tento dar o melhor de mim quando tenho a chance. Agora o técnico me deu a chance de jogar, e eu tenho de parar o disco."

Agora que o problema de fazer Bryzgalov deixar de só para o disco foi resolvido, o Colorado se debruça no problema seguinte: fazer ele deixar de parar o disco em desvantagem numérica. Nos três primeiros jogos da série, foram 19 oportunidades de vantagem numérica para os Avs, todas desperdiçadas, ou graças à defesa adversária ou graças a Bryzgalov, que, aos olhos do ataque de Denver, deve estar parecendo ter dois metros... de largura. Não adiantaram nem duas oportunidades de cinco contra três no terceiro jogo. Já são 31 desvantagens numéri-cas seguidas matadas pelos Ducks.

O primeiro desafio — vencer Bryzgalov — foi superado. Tarde demais, mas foi. A única esperança que a torcida dos Avs pode ter é que o segundo desafio — vencê-lo em vantagem numérica — não demore tanto, porque senão o jogo de quinta-feira pode representar o fim prematuro da série, com uma varrida que dará um belo descanso aos Ducks antes de pegar Oilers ou, mais provavelmente neste instante, Sharks nas finais de conferência.

E, nesse eventual descanso, Bryzgalov poderá dar entrevistas certa-mente mais longas do que a que deu em outubro de 2001, quando che-gou a Anaheim. Naquela ocasião, com seu vocabulário que não passa-va de 27 palavras em inglês, adentrou o vestiário, onde alguns jogado-res eram entrevistados, e gritou: "Alôôôô, mídia!"

Acho que ele pode repetir o grito nestes playoffs. Nós já ouvimos. Tanto é que ele está na capa da TheSlot.com.br nesta semana!


Alexandre Giesbrecht, publicitário, está numa fase em que não se cansa de ouvir "No One Knows", do Queens Of The Stone Age, em todas as versões possíveis e imagináveis.
FECHANDO O GOL Ilya Bryzgalov ficou quase 250 minutos sem saber o que era sofrer um gol (Jeff Vinnick/Getty Images - 08/05/2006)
"EVOLUÇÃO" Bryzgalov: de desconhecido a ídolo (Robert Laberge/Getty Images - 06/05/2006)
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Página publicada em 10 de maio de 2006.