Por: Humberto Fernandes

A ideia deste artigo nasceu da pergunta do leitor Fernando da Silva: "O Phoenix Coyotes vai sair de Phoenix? O time pediu falência? Qual a situação atual?"

A resposta deveria ser publicada em Faceoff, mas tamanha a importância do assunto e seu impacto na NHL, foi necessária uma coluna para tratar especificamente da atual situação dos Coyotes e do que pode acontecer no curto prazo com a franquia.

O texto a seguir nasceu de uma conversa com Marco Aurelio Lopes. Boa parte das informações foi fornecida por ele e há passagens de sua autoria, inclusive. O meu papel aqui foi de transformar a conversa em um texto e pesquisar detalhes importantes para preencher algumas lacunas.

O futuro dos Coyotes começará a ser decidido na quarta-feira, dia 27 de maio, na mediação envolvendo Jerry Moyes, o atual proprietário da equipe, e a NHL. A questão fundamental é: a quem pertence o controle do time?

Teoricamente, ao proprietário, mas a liga alega ter assumido o controle do time através de documentos assinados por Moyes, o que limitaria os poderes do proprietário, incluindo o poder de decretar falência. A suposta intervenção teria sido iniciada em novembro do ano passado. Seis meses depois, Moyes decretou falência, justificada pelo prejuízo milionário com a manutenção do time.

A mediação foi determinada pelo magistrado Redfield Baum, uma forma de dizer às partes: "resolvam os seus problemas". O papel do mediador é convencer os envolvidos a chegarem ao comum acordo sobre a questão. Se ele não conseguir, então o assunto será decidido nos tribunais. Essa é a hipótese mais provável, porque Gary Bettman e Moyes estão em guerra. Há muita hostilidade entre eles, chegando ao ponto de a liga questionar a integridade de Moyes, afirmando que ele falsificou documentos. Nesse ínterim o juiz se prepara para decidir a questão, estudando os papéis e as evidências entregues pelas partes. Acredita-se que em um ou dois dias após a mediação ele poderia dar o veredito.

Não há provas de que Moyes falsificou os papéis, mas não há como negar que ele cometeu um outro "crime", mais comum do que se imagina nesse meio. Durante algum tempo o proprietário dos Coyotes manteve a prática de comprar parte dos ingressos para os jogos do time que ficavam encalhados nas bilheterias, a fim de atingir a meta de público exigida pela NHL para classificar a franquia como apta a receber uma fatia da divisão de receitas. A liga descobriu e ordenou que ele fosse mais "cuidadoso".

Se o tribunal decidir a favor de Moyes, e essa parece ser a tendência, a primeira porta se abre para Jim Balsillie adquirir a franquia. O homem dos telefones celulares Blackberry ofereceu US$ 212,5 milhões pelos Coyotes, com a condição de que possa mudá-los para Hamilton, no Canadá.

A mudança depende de novo julgamento, com data para o dia 22 de junho, que vai determinar se a franquia pode ser realocada como parte de sua venda.

Esse ponto é ainda mais complexo que o anterior, porque é o conselho de diretores da NHL que decide sobre mudanças de franquias, não os magistrados. As demais grandes ligas norte-americanas enviaram documentos à corte apoiando a NHL, afirmando que a decisão favorável a Moyes, a venda da franquia e sua realocação sem a autorização prévia da liga poderia abrir um precedente perigoso no mundo esportivo.

A NHL está confiante na vitória nesta segunda disputa, que é a mais importante. O vice-comissário Bill Daly não espera que a decisão seja diferente do que muitos tribunais já decidiram ao longo dos anos a favor da competência das ligas esportivas para controlar a localização de suas franquias. O tribunal pode "atropelar" as regras da liga e os julgamentos do passado porque defende primariamente o interesse financeiro dos credores. Nesse sentido, o juiz pode até determinar que a franquia seja leiloada. Mesmo que um outro interessado ainda não identificado vença o leilão, a liga deverá persuadi-lo a manter a equipe onde está.

Do ponto de vista econômico, a NHL deveria agradecer aos céus pela proposta de Balsillie. É a que melhor satisfaz os interesses de Moyes e dos credores, ele é o homem do dinheiro. Mas a liga, ou melhor, o comissário Bettman não vê com bons olhos a entrada do bilionário canadense no seleto clube dos donos de equipes, em parte pela sua atitude de condicionar a compra da franquia à sua mudança para o Canadá. Um diretor de uma das franquias da liga disse recentemente que Bettman foi contratado pelo conselho de diretores da NHL com dois grandes objetivos, sendo que o principal era desenvolver o esporte nos Estados Unidos. Balsillie é visto como uma ameaça a esse princípio.

Não é a primeira vez que Balsillie tenta comprar um time. Em anos anteriores ele fez propostas por Buffalo Sabres, Pittsburgh Penguins e Nashville Predators, todas recusadas imediatamente pela NHL. Mas desta vez sua proposta e sua ideia são imbatíveis. O projeto "Make it Seven" (o Hamilton seria o sétimo time canadense na liga) já recebeu o apoio oficial de duas grandes marcas canadenses, a cerveja Labatt Blue e a loja de departamento Home Hardware. A cidade se comprometou a reformar o ginásio Copps Coliseum, onde jogaria a nova equipe. O bilionário rebelde até admite manter os Coyotes em Phoenix por mais um ano, se necessário, tempo em que ele poderia cuidar de toda a logística da instalação da equipe em Hamilton.

Hamilton está a menos de cem quilômetros de Toronto, a meca do hóquei no gelo, onde a demanda pelo esporte atinge níveis inimagináveis para todas as outras cidades envolvidas com a NHL. A estimativa de faturamento do Toronto Maple Leafs na temporada passada se aproxima de US$ 180 milhões, o dobro da média da liga. Os Coyotes faturaram pouco mais de US$ 50 milhões. É fato que os Maple Leafs sozinhos não atendem a toda a demanda por hóquei no gelo da NHL na região. Há espaço para outro time, mesmo se ampliada a região e considerada a concorrência com Buffalo Sabres e Detroit Red Wings.

Antes mesmo da novela envolvendo os Coyotes já se veiculava a possibilidade da instalação de outra equipe naquela região de Ontário. Como em todo negócio, há o risco da rejeição, mas, se ninguém espera que o novo time seja tão forte economicamente quanto os Maple Leafs, também não se espera que ele seja tão fraco quanto os Coyotes. O fato é que uma liga com 30 Maple Leafs faria da NHL o melhor negócio do mundo, enquanto uma liga com 30 Coyotes tornaria a atividade inviável.

Tanto a NHL não quer Balsillie em seu meio que até "vazou" na imprensa a suposta preferência da liga por Winnipeg, outra cidade canadense. Clara tentativa de "rachar" o projeto canadense, como se a liga dissesse que apoiaria uma franquia em Winnipeg — que nunca foi citada como possível destino dos Coyotes —, mas não em Hamilton. Para a infelicidade de Bettman não apareceu ninguém interessado em comprar o time e levá-lo para a antiga casa dos Jets. A tática de "qualquer um menos Balsillie" não funcionou.

A cidade de Glendale, no Arizona, onde está localizada a Jobing.com Arena, é outro empecilho para a venda da franquia. Para a cidade, a possibilidade de mudança do time é uma falsa premissa, porque uma cláusula do contrato de arrendamento do ginásio obriga que os Coyotes disputem todos os seus jogos como mandante na Jobing.com Arena durante 30 anos. A cidade pretende tomar parte na batalha judicial para impedir que a franquia seja vendida. Glendale acredita que tem o direito de impedir a realocação do time e afirma que os Coyotes estão presos ao Arizona.

Quem vai querer adquirir uma franquia que perdeu mais de US$ 200 milhões desde que se mudou para Glendale, onde, segundo consta, uma passeata no fim de semana a favor da manutenção da equipe na cidade reuniu não mais do que 200 pessoas? É consenso que os Coyotes não têm futuro onde estão hoje. É por isso que Moyes disse que teria sorte se vendesse a franquia por cem milhões de dólares.

Nesta guerra onde o dono pode não ser o dono e a liga pode decidir e ao mesmo tempo não decidir nada, a cidade pode ter o contrato e não ter direito algum. Os poderes de Glendale e do contrato de arrendamento se esgotam se o processo de falência for aprovado, porque com a falência os Coyotes ficam livres da multa rescisória, estipulada em US$ 750 milhões. Caso contrário, com a anulação do pedido de Moyes, os interessados em adquirir a franquia teriam que mantê-la em Glendale pelos próximos 26 anos.

Outro possível comprador dos Coyotes é Jerry Reinsdorf, proprietário do Chicago White Sox. Sua proposta é de "apenas" US$ 130 milhões, supostamente com a intenção de manter a equipe onde está. Existe alguma incerteza quanto a veracidade da proposta, tanto que os advogados de Balsillie estão preparados para exigir em juízo que a NHL apresente os documentos que comprovam o legítimo interesse de Reinsford em adquirir os Coyotes. A NHL diz que está pronta para isso.

Um terceiro interessado é o grupo formado por John Breslow, um homem de negócios de Las Vegas, que detém 3% dos Coyotes. Segundo os rumores, o técnico do time, Wayne Gretzky, faria parte do grupo de Breslow. Las Vegas é outra possibilidade de realocação comentada pela imprensa mesmo antes dos Coyotes entrarem em extinção, assim como Kansas City. Nas duas opções há mais risco que em Hamilton.

Independentemente do vencedor desta guerra, ao que tudo indica os Coyotes ficarão pelo menos mais um ano em Phoenix. Os preparativos para a temporada 2009-10 iniciam-se em setembro e toda a logística da liga e da franquia seriam prejudicadas com uma realocação, na melhor das hipóteses, entre junho e julho.

A NHL diz ter cerca de 55% do calendário da próxima temporada preparado. É mais uma forma de frear a mudança que ela não quer que aconteça.

Humberto Fernandes venderia pelo menos quatro franquias da NHL para Jim Balsillie.

AP
Jerry Moyes luta pelo direito de ser dono daquilo que lhe pertence. Depois de enterrar mais de US$ 300 milhões no Phoenix Coyotes, é compreensível que ele queira aceitar a proposta de Jim Balsillie.
(19/05/2009)

AP
O vice-comissário Bill Daly quer fechar as portas para Jim Balsillie. "Qualquer um, menos ele" é o lema da NHL na novela envolvendo os Coyotes.
(19/05/2009)

Edição Atual | Edições anteriores | Sobre TheSlot.com.br | Comunidade no Orkut | Contato
© 2002-09 TheSlot.com.br. Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução do conteúdo escrito, desde que citados autor e fonte.
Página publicada em 21 de maio de 2009.