Por: Igor Veiga

Confesso que, antes desse dia, eu não esquentava muito a cabeça com essa questão. Confesso que eu até gostava alguma vezes. Mas depois de domingo passado, não teve jeito.

Philadelphia Flyers e New York Rangers entraram no gelo do Wachovia Center para decidir qual seria o último time da Conferência Leste a se classificar para os playoffs. Ambas as equipes estavam empatadas em número de pontos, com os Flyers em pequena "vantagem" devido aos critérios de desempate. Uma vantagem que mais tarde seria simplesmente jogada na lixo.

Pois bem, a partida começa e as duas equipes estão mais que determinadas a sair do gelo com os dois pontos e vaga assegurada na pós-temporada. Tanto afinco fez que, ao final do tempo regulamentar, o placar confirmasse o empate por 1-1. Então, como já é de praxe, lá fomos nós para a clássica prorrogação com quatro-contra-quatro. Duas equipes "reféns" de um gol, sim, mas com o disco rolando, quatro jogadores de cada lado, troca de linhas, tática, talento individual e coletivo em ação... ou seja, hóquei ainda na sua melhor essência.

Só que, por ironia do destino, no tempo-extra, nenhum dos dois times conseguiu se prevalecer no rinque e, numa situação inusitada, e por ordem do regulamento que está em vigor desde a temporada pós-locaute, a partida teria que ser decidida em três cobranças de pênalti para cada lado.

Pois é. Durante a temporada, os pênaltis servem mais como um atrativo a mais no fim de jogo do que propriamente um critério para se decidir que uma equipe foi melhor que a outra naquele dia, até porque, é bom frisar mais uma vez, são apenas três chutes para cada lado!

Antes do início daquela disputa por pênaltis, me veio à lembrança a Copa União de 1988, versão do Brasileirão daquele ano, em que, durante a primeira fase do campeonato, as equipes participavam de uma (tosca) disputa de pênaltis após as partidas que terminassem empatadas. A (importante!) diferença é que os times que ganhavam no tempo normal ficavam com três pontos, enquanto as que venciam nos pênaltis levavam dois (derrota nos pênaltis valia um pontinho e no tempo normal, zero).

Vamos lá. Você faz 82 jogos durante a temporada regular, faz 300 gols, leva 100, 227, tanto faz, e, mesmo com os altos e baixos, tem um esforço filho da mãe para tentar chegar entre os oito de sua conferência para que, no fim de tudo, sua classificação seja decidida por quatro jogadores (os três de linha, mais o goleiro) numa disputa de pênaltis? Cara, estamos falando de TEMPORADA REGULAR! Não é mata-mata e não é um jogo de semifinal olímpica, em que você já entra sabendo que alguém tem que ser melhor do outro naquele dia, nem que isso seja decidido no par ou ímpar! Acho que a temporada regular existe justamente para se avaliar as equipes durante TODO o período. Nos mata-matas sim, o que vale é quem foi o melhor naquele dia, naquela semana, naquela série, tanto faz. E não adianta chorar.

Volto a dizer que, antes desse dia, eu até que simpatizava com os pênaltis ao final das partidas como um ingrediente a mais no fim do jogo. Para confirmar esta minha posição em relação a esta regra, é só ouvir o programa da Rádio Center Ice gravado no último dia 5 de março que contou com a participação do meu colega de redação Humberto Fernandes. Enquanto ele se mostrou totalmente contra os pênalstis, eu fiquei indiferente.

Mas, depois daquele 11 de abril de 2010 na Philadelphia, tudo mudou. Não dá mais para engolir essa parte da regra. Do que valeu os Flyers terem feito uma "melhor" campanha durante os 82 jogos? Mais gols, mais vitórias, que seja. Para entrarem nos playoffs, só restava a eles ganhar o jogo! Em outra época, era só tentar segurar o empate e pronto. Nada mais justo, até porque o jogo é de temporada regular! E o mínimo que um time deveria ter durante essa fase do campeonato é a chance de jogar com o regulamento debaixo do braço. Os Rangers, em desvantagem, poderiam desde o início tentar "cozinhar" o jogo, com o intuito de carregar a partida até a loteria dos pênaltis e, ali sim, tentar buscar a sorte. Na verdade, falar de sorte para um time que tem Henrik Lundqvist no gol é até exagero. Sei que os Flyers também ganharam seus pontinhos dessa forma, mas a questão aqui é você decidir todo um trabalho após seis cobranças de pênaltis! E isso vale para ambos, Rangers e Flyers.

E que me perdoem os fãs dos Rangers, mas acho que a justiça foi feita. Os Flyers venceram os pênaltis por 2-1, ficaram com os dois pontos do jogo, e avançaram rumo à pós-temporada. Não digo justiça porque eles têm o melhor time, mas porque, caso o regulamento fosse o mais correto, a partida terminaria empatada após o tempo-extra e a vantagem ainda seria deles. Pronto. E veja também pelo outro lado: quem pode dizer que os Rangers não mereceram se classificar? Os caras podiam muito bem ter ganho aqueles pênaltis e a história seria outra. Naquele momento, todo o trabalho feito durante toda a temporada regular foi pro lixo. O que importava mesmo era que três caras do seu time fossem capazes de colocar o disco dentro da rede no cara-a-cara com o goleiro adversário e fim de papo. Essa é a questão.

Das duas uma: ou a NHL começa a favorecer os times que conseguem vencer os jogos com o disco rolando (seja no tempo normal ou na prorrogação, até!), ou então que se dê fim a esse sistema idiota de disputa de pênaltis durante a temporada regular. E se Gary Bettman e cia. quiserem uma ajuda, eu e Alexandre Giesbrecht podemos enviar para eles uma xerox do Guia do Copa União de 1988 da revista PLACAR que pode acabar sendo útil.

Ponto para a CBF.

Ponto para o Humberto.

Igor Veiga está comprando tempo.
Matt Slocum/AP
Matt Carle e Danny Briere comemoram com o goleiro Brian Boucher a defesa que valeu aos Flyers a passagem para os playoffs. O mata-mata começou mais cedo este ano.
(11/04/2010)
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Página publicada em 16 de abril de 2010.