Por: Alexandre Giesbrecht

O termo em inglês, bloopers, soa muito mais abrangente e menos forçado, mas no Brasil a tradução acabou virando, mesmo, "vídeo-cassetadas", graças à popularidade — nas duas acepções do termo — do programa "Domingão do Faustão". (Parêntese: nunca imaginei que tal programa teria espaço em TheSlot.com.br.) É natural que um esporte disputado sobre o gelo, como o que cobrimos, contenha diversas cenas dessa natureza, que acabam nem precisando de efeitos de sonoplastia, como cantadas de pneus e batidas de carros, para ficar engraçadas. Mas nesta última semana tivemos lances de comédia suficientes para uma coluna. (Outro parêntese: se bem que ainda na semana passada tivemos uma coluna que também dedicou alguns parágrafos a um único lance tosco, embora não fosse o assunto principal. Serve para mostrar como os últimos sete dias foram recheados de bizarrices.)

Comecemos pela segunda-feira, quando o próprio fim do tempo regulamentar da partida entre Penguins e Rangers foi digno de vídeo-cassetadas, não pelos lances em si, mas pela situação. Os Rangers venciam por 1-0 em pleno Consol Energy Center, a nova casa do adversário, e seu goleiro Henrik Lundqvist parecia imbatível naquela noite. Faltando pouco menos de três minutos Chris Kunitz conseguiu o empate em um lance chorado. A 1:53 do que seria o fim de jogo, Matt Cooke virou a partida. Lundqvist, enfezado, destroçou seu taco contra o gol e ganhou de brinde uma estadia de dois minutos no banco de penalidades, revertida para Sean Avery, por conduta antiesportiva.

Com um homem a mais, seria quase seguro declarar os Pens vencedores, certo? Sim, certo. Seria quase seguro. Nem meio minuto depois Marc Staal empataria a partida com um gol em que o disco desviou na trave e nas costas do goleiro Marc-André Fleury, mas que ainda não era a vídeo-cassetada da noite. Esta estava reservada para o lance decisivo, na prorrogação, quando o zagueiro Zbynek Michalek ganhou de Ryan Callahan na corrida e ficou com o disco… por aproximadamente um segundo. Ao tentar dar prosseguimento à jogada, ele tombou, tal qual se tivesse trocado suas habilidades de patinação com as minhas (inexistentes). Callahan roubou o disco e passou a Brandon Dubinsky, que driblou Paul Martin com facilidade graças à grotesca tentativa de bloqueio rente ao gelo do defensor do Pittsburgh. Em seguida, devolveu a Callahan e este não teve dificuldade para, na frente do gol, redirecionar o disco para dentro, dando números finais à partida e ganhando a capa desta edição de TheSlot.com.br, neste instante a honraria máxima de sua carreira.

Dois dias depois foi a vez de o goleiro Jaroslav Halák, tão sólido nos últimos playoffs e no começo desta temporada, mas que foi traído em um lance banal. A partida ainda estava 0-0 e Drew Miller chutou sem grandes pretensões a gol para uma defesa fácil de Halák. Como o disco subiu, o arqueiro decidiu afastar o perigo com seu taco, aquele tipo de lance que qualquer goleiro não passa uma partida sem fazer. Ele rebateu o disco na direção certa, mas a lâmina do taco pôs-se no meio do caminho e desviou o pedaço de borracha para dentro do gol, um dos gols contra mais bizarros da semana, da temporada e quiçá do jovem século.

Se um dia o lance fizer parte de um DVD de vídeo-cassetadas de hóquei, nem precisará de sonoplastia adicional, pois os responsáveis pelo sistema de alto-falantes da Joe Louis Arena, em Detroit, foram bastante criativos ao pôr para tocar uma música circense geralmente reservada a malabaristas. "Eu não me lembro de nada parecido com isso", lamentou Halák após o jogo, referindo-se ao gol. "[Esse tipo de coisa] acontece. O que mais eu posso dizer a respeito? Eu estava tentando jogar [o disco] para atrás do gol, no canto. Deu um quique bizarro. O que posso falar?"

Os Blues chegaram a virar o placar, sofreram nova virada e empataram a partida em 3-3, mas, com seu goleiro talvez abalado pelo gol inicial, perderam a partida por 7-3. A derrota foi a quinta seguida dos Blues, sendo que Halák esteve no gol de quatro delas, com apenas 80% de defesas. O reserva Ty Conklin foi escalado para o confronto com os Senators, na sexta-feira, e venceu por 5-2, com Halák voltando na partida do dia seguinte, contra os Devils. Ele sofreu um gol no primeiro chute do adversário, mas ajudou na vitória por 3-2 que jogou o time de New Jersey na lanterna da liga por pontos perdidos.

No dia seguinte um jogo que pode ser classificado como uma vídeo-cassetada de 60 minutos se você tomar o ponto de vista das defesas, tanto é que nenhum dos goleiros que começaram a partida chegou ao segundo período, tamanha a ineficiência dos mesmos em defender discos: a primeira etapa terminou com 5-4 para os Flyers sobre o Lightning no placar, sendo que aos dez minutos o jogo já tinha cinco gols. No segundo período, o ritmo diminuiu um pouco, e, após 40 minutos, o placar marcava 7-7. O terceiro período foi quase um tédio, se comparado aos demais, com apenas um gol, que deu a vitória ao time da Flórida por 8-7. Apenas oito dos 36 jogadores de linha que entraram no gelo não marcaram ao menos um ponto, sendo três dos Bolts e cinco dos Flyers. Não foi como os 10-8 que os Sharks aplicaram nos Penguins em 1996, mas certamente deu um déjà-vu aos que acompanharam aquela partida de 14 anos atrás.

Mas o placar por si só não seria bizarro o suficiente para trazer essa partida para esta coluna. Um lance específico, um gol do Tampa Bay que diminuiu a vantagem que os Flyers tinham então para 5-4 passaria despercebido se não fosse um probleminha na rede. Ou melhor, o gol quase passou despercebido pela arbitragem. Brett Clark chutou do meio do círculo esquerdo, e o disco passou pelo goleiro Sergei Bobrovsky, entrando no gol, mas saindo quase que imediatamente, provavelmente por um buraco na rede. Como o trajeto que o disco percorreu foi quase uma reta, saindo por cima das bordas, poucos perceberam o que tinha acontecido. Clark, pelo visto, notou, tanto é que comemorou, e seus companheiros de time, talvez alertados pela sua reação, imediatamente começaram a apontar para o gol. Não ficou claro se o árbitro inicialmente marcou o gol. No vídeo não se ouve o apito (o de gol, bem entendido), mas ele, depois da reação de Clark, aponta para o gol. O que importa é que os replays confirmaram o gol, que foi oficializado alguns minutos depois, debaixo da previsível chuva de vaias na Filadélfia.

Para fechar a semana, dois lances no sábado. Em Boston, Dustin Brown, dos Kings, resolveu tentar tomar à frente no ranking do Troféu Ilya Kovalchuk de destreza com o disco na disputa por pênaltis e caiu sentado diante do goleiro Tim Thomas, dos Bruins, ao tentar fazer… eu não sei que diabos ele tentou fazer. A primeira impressão ao assistir ao lance em câmera lenta é que ele tentou, involuntariamente, chutar o taco para que este disparasse o disco. Sua tentativa poderia ter decidido a parada, que ainda estava 0-0. Felizmente para ele, a decisão por pênaltis terminou com a vitória de seu time graças a um gol de Michal Handzus na sexta série.

Enquanto isso, em Buffalo, o goleiro Patrick Lalime, dos Sabres, teve um lapso à Oséas e, com o disco dominado e sem ser ameaçado por Adam Hall, do Lightning, simplesmente deu um passe perfeito. Para o próprio Hall, que teve algum trabalho para livrar-se do arqueiro e mandar o disco para o fundo do gol, mas completou o serviço. O gol fez a diferença na vitória por 2-1 do Tampa Bay.

O sábado ainda teve um passe de Mike Komisarek, dos Leafs, para Mike Cammalleri, dos Canadiens, fazer o segundo gol dos 2-0 de seu time, uma outra pérola, embora não tão bizarra. Mas serviu para fazer do sábado uma chave de ouro de ouro para fechar uma semana tão prolífica em vídeo-cassetadas na NHL.

Alexandre Giesbrecht, 34 anos, .
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Página publicada em 21 de novembro de 2010.