Por Marcelo Constantino

Diz o ditado que somente os bons morrem jovens. Ainda bem que vários jovens vivem, mesmo quando precisam deparar-se de frente com a morte.

Na última terça-feira, 9 de abril de 2002, Saku Koivu retornou ao time do Montreal Canadiens, finalizando uma história que não poderia ter começado pior. Era o primeiro jogo em um ano do capitão, o camisa 11 do time de mais títulos conquistados na NHL. No total, foram 367 dias sem jogar.

Mario Lemieux já venceu sua batalha com o câncer. Roger Neilson também. Para engrandecer ainda mais esta semana especial na história da NHL, o Ottawa Senators anunciou que Neilson comandaria o time nas duas últimas partidas para atingir a marca de 1.000 jogos como técnico na NHL.

No caso de Koivu, ele informou em setembro do ano passado estar com câncer. Os prognósticos iniciais detectaram câncer na região abdominal e, para cada dez pessoas que o contraem, apenas uma sobrevive. Se o câncer atinge o fígado ou o pâncreas, as esperanças se esvaem. "Se chegar ao Natal, Saku será uma pessoa de sorte", foi dito na época.

Mais tarde foi descoberto que Koivu tinha, na verdade, algo como um linfoma não-Hodgkin, pior ainda que o câncer que atingiu Mario Lemieux. O pâncreas e o fígado ainda não haviam sido afetados, então havia esperança.

Mas o quadro ainda era tenebroso. O médico que cuidou de Koivu, Dr. David Mulder, iniciou o tratamento à base de quimioterapia e, após as primeiras semanas, as chances de sobrevivência ainda eram de 50%. Sua dedicação e a boa forma que qualquer jogador precisa ter para atuar na NHL colocaram Koivu numa posição provilegiada para o tratamento. Quimioterapia é um tratamento que implica em grande violência ao corpo humano, com muita dor e intenso processo de debilitação física. Num determinado momento, as dores de cabeça estiveram tão fortes que ele teve de se trancar por quatro dias num quarto escuro e silencioso. Graças à excelente forma física do jogador, os médicos puderam receitar massivas doses de quimioterapia, sabendo que ele poderia suportar níveis a que a maioria das pessoas não resistiria.

Saku Koivu resistiu a tudo, venceu o câncer e está de volta à NHL.

Com a classe por que sempre se caracterizou, Koivu e sua esposa chegaram a mandar mais de 20 mil cartões de Natal para todos que escreveram para a família. Um mês após o diagnóstico inicial, já em tratamento, Saku fez questão de dar uma entrevista coletiva: ele queria que os torcedores soubessem como ele estava progredindo.

O retorno triunfal de Koivu combinou com a classificação para os playoffs, mas sua história é muito mais do que apenas isso. Uma batalha de vida contra a morte, em desvantagem, usando a força de vontade, a forma física e a tecnologia contra o mais voraz dos assassinos que residem em nosso corpo.

O jogo -- A volta de Koivu ao gelo desviou o foco das atenções da partida, cuja vitória garantiu aos Canadiens uma vaga nos playoffs.

Os cambistas fizeram a festa. Montreal só havia lotado o estádio em oito dos 39 jogos em casa anteriores e havia gente vendendo bilhetes por até 250 dólares canadenses, cerca de cinco vezes mais que o preço normal.

Koivu foi o úlitmo jogador a entrar no gelo, sendo ovacionado, de pé e por oito minutos, pelos 21.273 torcedores que lotaram o estádio. Os jogadores posicionaram-se para ouvir o hino canadense e a platéia ainda gritava "Saku, Saku".

Saku perdeu o face-off inicial para Radek Bonk e retirou-se depois de 22 segundos de partida, tendo jogado ao lado de Andreas Dackell e de Joe Juneau e sem ter tocado no disco. Jogou mais oito minutos, entrando mais doze vezes no gelo e não deu chutes a gol. Ainda assim, foi escolhido como a primeira estrela da partida.