O torcedor brasileiro da NHL vivia uma realidade sonhada há muito: ter jogos ao vivo disponíveis — mesmo que na clandestinidade — na Internet. Podendo até mesmo escolher qual prélio acompanhar, muitos se sentiram como os canadenses nas noites de sábado. Estava tudo lá, Hockey Night in Canada em dose dupla, com direito ao genial Don Cherry desfilando sua acidez no intervalo. Mas a mente diabólica de Gary Bettman subverteu brutalmente nossa genuína felicidade. E o que era luz se transformou em trevas.

Com isso não dá mais para negar que o cargo de comissário da NHL, nas mãos do Sr. Gary Bettman, constitui em um desastre para o esporte que amamos. O que esse indivíduo vem se esforçando para transformar a nossa estimada NHL em uma liga obscura não está no mapa. Daqui a pouco a liga terá menos cobertura da imprensa que os Jogos Indígenas do Centro-Oeste.

E o que as grandes publicações esportivas que cobrem a NHL falam sobre o descaso dos engravatados com os torcedores que vivem fora do eixo EUA-Canadá? Pouco, ou nada. Talvez tenham sido compradas por Bettman e seus asseclas. Mas a sua TheSlot.com.br não se vende. A não ser que apareça alguém com um caminhão de cerveja ou com bilhetes grátis para uma semana em algum bar de strip-tease, não nos vendemos por nada! Se a The Hockey News ou a TSN não têm coragem suficiente para iniciar uma guerra contra o comissário infeliz, nós temos.

Então começa agora uma das maiores contendas da Internet: TheSlot.com.br contra Gary Bettman. Não será uma batalha curta e simples. Talvez sangue inocente escorra teclado adentro. Por isso, retire as crianças da frente do monitor. E se você acha que Bettman não vale sua cólera, deixo a seguir parágrafos que provam como ele vem tentando destruir a NHL. É degradante e revoltante.

A era Bettman começou em dezembro de 1992, quando o hóquei era dominado pelo bem. Mario Lemieux — mesmo envolto aos problemas de saúde — reinava absoluto com seu talentoso Pittsburgh Penguins. Wayne Gretzky ajudava a popularizar o esporte na Califórnia, onde defendia as cores dos Los Angeles Kings. Até mesmo o Toronto Maple Leafs voltava a ganhar respeitabilidade na NHL. Ah, justiça seja feita, nessa época um sólido acordo com a ESPN foi firmado.

A primeira temporada da NHL com Bettman como comissário coincidiu com a 100ª decisão da Copa Stanley da história. E teve um script magnífico, ao ser disputada entre o maior vencedor da história do troféu e a equipe onde o maior colecionador de recordes desfilava sua classe: Montreal Canadiens e Los Angeles Kings. Oriundo da NBA, Bettman começava com sorte, e continuou assim na temporada seguinte.

Goste você ou não, quando uma equipe de Nova York vence uma das quatro grandes ligas, a modalidade correspondente ganha uma visibilidade ainda maior na capital da mídia mundial e isso acaba refletindo em boa parte dos Estados Unidos. Em 1994 o NY Rangers e o Vancouver Canucks fizeram uma série espetacular, onde a equipe de Mark Messier prevaleceu após sete partidas sobre os Canucks de Pavel Bure. A Copa Stanley voltava para o mais popular time de hóquei da região após 54 anos. Russos fizeram parte dessa conquista de forma integral, o que rendia ótimas histórias para jornais e TV e, pela primeira vez, um jogador norte-americano — Brian Leetch — vencia o Troféu Conn Smythe, como atleta mais valioso da pós-temporada.

Era o momento da NHL no que chamam de "capital do mundo". Bastava saber aproveitar e ganhar de vez seu lugar. A NHL conquistaria a América e depois o mundo! O passe para Bettman veio na medida para um chute de primeira. Estava a poucos centímetros do gol, e a meta estava sem goleiro. E Bettman errou. Miseravelmente Bettman não soube aproveitar o momento. Não soube contornar as contendas que se aproximavam.

Ao ver que, com a popularidade crescente, os jogadores iam querer mais da fatia do generoso bolo produzido pela liga, os donos das equipes pediram uma pausa para repensar o modo operante da liga. Eles queriam o teto salarial. Óbvio que os atletas não. E o Sr. Gary Bettman? Mais perdido que Sandis Ozolinsh voltando para sua defesa após gerar mais um erro na zona ofensiva. Inaptidão total para resolver essa contenda entre atletas e donos. O porta-voz dos jogadores, Bob Goodenow, teve até seu intelecto criticado pelos donos. O onipresente Chris Chelios — que havia presenciado a final da 2ª Copa Stanley, entre Montreal AAA e Ottawa Generals em 1894 junto ao seu sobrinho de 37 anos — criticava abertamente o nível mental de Gary Bettman. E os torcedores? Bem esses estavam %4#*&!

A coisa deveria ter se resolvido ali. O bolo deveria ter sido divido de forma justa. Sentar e conversar. Mas não. E isso acarretou em uma NHL para privilegiados.

Privilegiado não era exatamente o status de times como Quebec Nordiques, Winnipeg Jets e Hartford Whalers, que perderam vez para cidades onde o hóquei não tinha força. Incrível ver os Jets em Phoenix. Pra quem começou a acompanhar a liga em 1996 e pôde ver alguns jogos da equipe de Winnipeg e agora ver como são insossos os jogos dos Coyotes no Arizona, chega a ser deprimente. A NHL não era mais para eles. Apenas um negócio. Existia algum lucro nessas saudosas equipes, mas não o bastante.

Após uma batalha sem vencedores, que durou 103 dias, a temporada 1994-95 só teve início em 20 de janeiro de 1995. E os playoffs daquele ano mostraram a vitória do jogo defensivo apregoado por Jacques Lemaire. Culpa do New Jersey Devils? De Lemaire? Claro que não. Se, para a armadilha da zona neutra ser efetiva, é necessária certa complacência arbitral, a culpa estava em quem deveria cobrar dos árbitros uma postura correta.

Todos passaram a copiar, em parte ou integralmente, esse estilo. Em pouco tempo, jogadores medianos como Bobby Holik se tornavam tão ou mais importantes para sua equipe quanto Teemu Selanne ou Sergei Fedorov. Durante as finais de 2000, não muito raro era ver a velocidade abissal de Mike Modano sumir ao ter sempre o taco de Holik colado ao seu estômago. O mesmo Dallas Stars vítima, foi o Dallas Stars vilão. Quem não se lembra o quão útil era o seu capitão Derian Hatcher no reino do segura e engancha? Hatcher às vezes segurava o adversário por 10 segundos nas bordas sem que o árbitro marcasse a penalidade. Jogo defensivo é uma coisa, ilegalidade é outra. Muita gente colocou isso no mesmo saco e Hatcher virou um milionário. E que tipo de jogador ele é hoje numa NHL que segue seu livro de regras? Um defensor que aplica alguns bons trancos e que, às vezes, cumpre um bom papel protegendo seu goleiro. Muita pouca tarefa pra quem ganha milhões, e por isso os Flyers querem se livrar dele o quanto antes.

O caos na arbitragem atingiu seu ponto máximo no jogo 6 das finais de 1999. Com a partida empatada em 1-1, os Sabres tentavam vencer os Stars em seu território e forçar uma sétima partida em Dallas. Com 5:09 restando no placar da Marine Midland Arena — hoje HSBC Arena — para o final do terceiro tempo extra, Brett Hull, com um patim na área de Dominik Hasek, marcou o gol do título. Com toda a tecnologia a seu favor, os geniais sujeitos de listras brancas e negras, ignoraram a infração de Hull (na época, se algum jogador do próprio time estivesse dentro da área, o gol não era validado).

Placar baixo, jogo amarrado e pagando por um produto onde até mesmo a Copa Stanley era decidida com um gol irregular, o torcedor passou a ver também uma NHL onde cada vez menos jogadores atravessavam a barreira dos 50 gols ou 100 pontos.

E, se Holik ou Hatcher passaram ganhar muitos milhões, isso dava direito a jogadores que chamavam muito mais público e mídia a exigir ainda mais. E não podemos tirar a razão de um Martin Brodeur ou de um Jaromir Jagr por querer receber mais que um Bobby Holik. Com isso a média salarial subiu e subiu até chegar a um nível estratosférico.

Uma tragédia estava perto de acontecer. A bomba que foi parcialmente desativada em 1995 voltou e estava com sua contagem regressiva se aproximando do zero. Buffalo Sabres, Calgary Flames, Edmonton Oilers e Ottawa Senators correndo riscos constantes de seguir o mesmo caminho dos Whalers, Nordiques e Jets. Mesmo o tradicionalíssimo Montreal Canadiens patinou sob gelo fino.

Até que, após a pós-temporada de 2005, veio o grande locaute. Uma temporada inteira cancelada. Previsível diante de tantos erros administrativos desse incompetente comissário. Quem acompanhava a NHL superficialmente abandonou de vez; alguns fãs fiéis, sentindo-se traídos, foram dedicar seu tempo e dinheiro a outras modalidades.

Basicamente os mesmos motivos do primeiro locaute, só que, com cifras bem mais obesas em jogo. Após muito custo a NHL voltou. Graças a Gary Bettman? Claro que não!

Entrou em cena gente que realmente se importa com o jogo de hóquei. Gente que se importa com você, você mesmo, estimado leitor. Entrou em ação gente como Brendan Shanahan.

O atacante dos Rangers fez o que Bettman deveria ter feito: reunir as partes envolvidas em prol do bem comum. Organizou encontros onde foram discutidas medidas que beneficiariam o jogo, que fossem agradáveis para os fãs e para os atletas. Medidas que, modéstia à parte, sempre foram defendidas por gente de costumes simples — mas dignos —, como eu e como o nobre leitor da TheSlot.com.br. O fim da linha vermelha, a adoção de disputas de pênaltis para abolir esse aborto esportivo conhecido como empate, a redução do segura e engancha de cada dia e o controle maior sobre o tamanho do equipamento dos goleiros, entre outras idéias.

Foi um sucesso. O inevitável teto salarial também veio. Agora será bem sucedida a franquia que melhor souber investir e que melhor souber recrutar. Paridade que tranqüiliza algumas torcidas (infelizmente nem todas), que corriam riscos de verem suas equipes migrarem.

Mas nada disso graças a Gary Bettman.

Se Jussi Jokinen faz todos levantarem de suas cadeiras cada vez que patina rumo ao gol adversário numa decisão por pênaltis, isso não é mérito de Bettman.

Se jogadores como Alexander Ovechkin e Sidney Crosby ultrapassaram a marca dos 100 pontos em sua temporada de estréia, isso não foi mérito de Bettman.

Se a média de público e satisfação dos torcedores aumentaram, se agora temos grandes reviravoltas no placar, mais contra-ataques, mais passes longos, isso tudo não foi mérito de Bettman.

Se os inesperados Carolina Hurricanes, Buffalo Sabres, Edmonton Oilers e Anaheim Ducks protagonizaram as duas últimas finais de conferência com altas doses de velocidade, fluidez, trancos e gols, isso não foi mérito de Bettman.

Mas, se com tudo isso, não temos acesso prático e constante a essa renascida NHL, isso sim é mérito, ou pior, culpa, de Gary Bettman. Que ainda continua atrapalhando.

A ESPN podia nos tratar como porcarias aqui na América latina, mas no Hemisfério Norte ela dava a visibilidade mínima que a NHL precisava. Após o locaute ela ofereceu menos do que a NHL queria e perdeu os direitos para um obscuro grupo. A OLN (hoje Versus) deve ser elogiada por ter acreditado na NHL, mas para os brasileiros essa troca significou o fim das nossas migalhas na calada da madruga.

Então voltamos ao que falei no início desse texto. Sem NHL na ESPN, boa parte dos fãs ao redor do mundo encontraram a salvação através de nobres seres humanos, que vinham disponibilizando jogos ao vivo do pacote Center Ice. É evidente que a NHL é um produto que deve custar algo. Mas se a liga não vende esse produto para todos, só podemos ter acesso através da clandestinidade. Uma porta se fechou (temporariamente?), mas não há de ser nada, a Internet é uma invenção gloriosa e novos meios de burlar essa vontade do comissário de nos privar de nossa grande paixão em breve surgirão. Mas que, após meses de felicidade acompanhando, em horário nobre, nossa querida NHL, essa medida nos enche de ódio, disso não há dúvidas.

Como palavra final deixo algo que sempre digo aqui na redação da TheSlot.com.br: O inferno tem uma parte especial dedicada para pessoas como o comissário, que tanto faz para atrapalhar o desenvolvimento do melhor jogo da Terra. Quando a queda para as profundezas chegar para essa hedionda criatura, desejaremos boa viagem ao Sr. Bettman e agradeceremos. Por nada.

EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA!

Os engravatados da NHL reuniram-se recentemente e decidiram que ainda é uma ótima idéia termos oito confrontos entre equipes de cada divisão, e que alguns clássicos entre equipes originais não tenham sequer um exemplar, ou que alguns torcedores do leste só possam ver Teemu Selanne ou Dallas Drake uma vez a cada três anos de acordo com a rotação e bla bla bla. Com isso continuamos a ver Red Wings contra Blue Jackets, Coyotes contra Kings, Panthers contra Capitals em oito cansativas datas durante a temporada regular. Mais uma vez o bom senso recebe um choque-cruzado por trás da incompetência que reina na alta cúpula da NHL.


Eduardo Costa não sabe se essa coluna ficou decente, já que já estava em sua segunda garrafa de vinho quando começou a escrevê-la.
QUEM? Nome científico: Tapirus terrestris. Nome vulgar: Gary Bettman
(arquivo NHL)
 
HOLIK Ele é um dos símbolos de uma era nefasta, aqui em sua versão moderada, usando apenas um braço para segurar um adversário.
(Arquivo TheSlot.com.br)
 
 
Edição atual | Edições anteriores | Sobre TheSlot.com.br | Comunidade no Orkut | Contato
© 2002-06 TheSlot.com.br. Todos os direitos reservados. Permitida a republicação do conteúdo escrito, desde que citada a fonte.
Página publicada em 13 de dezembro de 2006.