A se manter o panorama atual, o Anaheim Ducks não vai decolar vôo
o suficiente. Era para hoje o time estar brigando ao lado do Nashville
Predators, Detroit Red Wings e Calgary Flames pelas duas vagas restantes
dos playoffs pela Conferência Oeste. Pelo menos era no que eu acreditava,
no que eu apostava desde as Olimpíadas de Inverno.
A equação na minha cabeça era relativamente simples: o time estava em ascensão até a parada para as Olimpíadas de Inverno, o principal jogador do time vencedor das Olimpíadas é o principal jogador dos Ducks, a gerência entrou no mercado de trocas como compradora e reforçando a defesa, e o time tem ótimo equilíbrio entre experiência e juventude.
Agora vamos desenvolver melhor cada ponto. Perto da parada para as Olimpíadas, o time parecia ter engrenado numa reta ascendente, vencendo seis dos últimos oito jogos. Ou 14 dos últimos 20. Apenas dois pontos separavam o time da turma dos playoffs no dia em que as colocações ficaram “congeladas” para os Jogos de Inverno. Dois pontos!
Então o próximo passo seria verificar como se sairiam os principais jogadores do Anaheim, distribuídos pelas seleções das Olimpíadas. Dos jogos a que eu assisti nas Olimpíadas (basicamente os dois confrontos entre Canadá e EUA), Ryan Getzlaf foi o jogador mais dominante. Sua linha, especialmente o duo com Corey Perry, era o que havia de mais vigoroso nos jogos. Embora isso não seja automático e absolutamente nada garanta isso, era de se esperar que os dois voltassem no mesmo ritmo, para pelo menos liderar o time rumo aos playoffs.
Veio o dia-limite de trocas logo a seguir a gerência foi naturalmente compradora: diante da minguada disponibilidade de bons jogadores, o gerente geral Bob Murray fez bom trabalho — tanto que listei os Ducks entre os cinco times que mais se reforçaram naquele dia. Murray buscou reforçar o setor defensivo do time, ainda carente sobretudo desde a saída de Chris Pronger. A equação Lubomir Visnovsky + Aaron Ward – (Nick Boynton + Ryan Whitney) era algo que dava um bom saldo positivo, na minha concepção.
Antes disso, os Ducks haviam se livrado do ex-MVP e Conn Smythe Jean Sebastien Giguere. Em troca chegou basicamente (no fim das contas, porque Vesa Toskala chegou, não jogou e foi negociado no dia-limite) Jason Blake. Giguere estava barrado há tempos e perdeu os últimos cinco jogos em que foi escalado. Com um salário pesado demais para o currículo recente, era difícil encontrar um time que quisesse ter o goleiro e pagar o caminhão de dinheiro que ele recebia, e ainda pagar algo em troca disso. Os Ducks encontraram: o Toronto Maple Leafs, que mandou Blake. Se Blake voltaria a ser o goleador que foi um dia, era outra história. Ao menos os Ducks conseguiram quem se dispusesse a pagar alguma coisa por Giguere.
Ou seja, os Ducks eram um time reforçado — sobretudo defensivamente —, aditivados pela performance de Getzlaf (e também Perry e Scott Niedermayer) nas Olimpíadas, e em ascensão. Mais que isso, os Ducks são um time de chegada — vide a temporada passada —, com boa química entre experiência e juventude.
Mas não funcionou. Ou não está funcionando até aqui.
A volta das Olimpíadas foi um desastre: cinco derrotas seguidas, duas delas sem conseguir sequer marca um gol. Até o Columbus Blue Jackets (!!) meteu 5-2 no time. Cometer penalidades tornou-se praticamente sinônimo de levar gol – foram oito sofridos nessas cinco derrotas. O Getzlaf dominante ficou em Vanvouver.
E então, o que vem acontecendo?
A desculpa das “contusões de jogadores que assolaram o elenco ao longo da temporada” é clichê — há uma fila de times com essa desculpa na ponta da língua em caso de fracasso. Embora evidentemente isso tenha afetado o rendimento do time. Jogadores úteis como Saku Koivu e Joffrey Lupul (item principal de retorno da troca que mandou Pronger para a Philadelphia), além de ícones como Teemu Selanne, perderam pencas de jogos.
Entretanto, ainda que clichê, a desculpa das contusões valeria para a temporada inteira, e não para esse período específico pós-Olimpíadas e dia-limite.
Murray recentemente culpou... as próprias Olimpíadas! Irritado e decepcionado com a campanha pós-Olimpíadas da equipe, Murray disparou contra a participação da NHL nos Jogos Olímpicos (ele seria contra a NHL continuar participando, ou seja, enviando jogadores), mas no fundo ele sabe bem o que está acontecendo: “Você tem de querer muito”, disse ele. “No fim das contas nós não temos jogadores suficientes querendo muito” (o original é melhor definido: “You have to want it bad. Bottom line, we don't have enough guys wanting it bad.").
Esse é um ponto que também é clichê, mas que é invariavelmente verdade na NHL. Você tem de querer muito pra conseguir, não adianta ser bom. A história da NHL está recheada de times supostamente melhores sendo derrubados por outros mais raçudos. O próprio Anaheim Ducks (na época “Mighty”) protagonizou uma espetacular corrida nesses moldes nos playoffs de 2003.
A vitória por 4-2 sobre os rivais, líderes do Oeste e favoritíssimos Sharks no último domingo pode sinalizar uma mudança de atitude na equipe, que até então parecia ainda não ter se dado conta de que é necessário jogar em ritmo de playoffs — se lá quiserem estar daqui a três semanas. De nada adiantam a ascensão anterior, os reforços e o sucesso nas Olimpíadas se a equipe agora não jogar como se cada partida fosse um jogo 6 ou 7 de final de Copa.
Chegar lá ainda é possível, ainda há 14 jogos pela frente (esta matéria
está sendo escrita na terça-feira). Mas vai ser preciso uma campanha
espetacular daqui por diante, com direito a no máximo uma ou duas derrotas
(para piorar, Selanne e Getzlaf machucaram-se no domingo). Em tese,
esse time é capaz. Basta fazer exatamente o que foi feito na reta final
do ano passado.
Marcelo Constantino já dirigiu por toda a lendária Rota 66, em 1997, seguindo integralmente o site historic66.