Por: Alexandre Giesbrecht

Desde que comecei a entender como funcionava essa história de sete jogos nos playoffs da NHL, a prorrogação me fascinou ainda mais do que o normal, e isso porque eu já tinha tido uma experiência inesquecível com prorrogação alguns anos antes. Mas o que a NHL oferecia era a morte súbita, que podia ser ainda mais emocionante em um jogo 7, depois de seis outras partidas que refletiriam muito bem o equilíbrio entre dois times. Desde então, sempre esperei por uma prorrogação de jogo 7 nas finais da Copa Stanley.

Esse momento ainda não chegou, mas ver uma Copa decidida na prorrogação, ainda que o time perdedor não tivesse a chance de conquistá-la se o gol tivesse saído do outro lado, é sempre uma experiência emocionante. Quer dizer, nesta última semana aprendi que é quase sempre uma experiência emocionante.

O gol de Patrick Kane, importante como foi, não teve a emoção que se esperaria. Não deixou de ser um anticlímax ver os narradores da NBC e da CBC perdidos, sem saber exatamente o que aconteceu, especialmente para nós aqui do Brasil, que contamos com imagens pequenas e granuladas nas telas de nossos computadores. Talvez nosso amigo Dave Clayton, assistindo em uma televisão LCD, possivelmente em HD, tenha comemorado no mesmo instante em que o disco cruzou a linha, mas mesmo essa possibilidade não é tão grande, considerando-se que até quem estava no gelo não percebeu o gol imediatamente.

Além de Kane, o outro Patrick no rinque, Patrick Sharp, pareceu ser a única pessoa que viu o gol. Pode assistir de novo ao lance: Sharp, na parte de baixo do vídeo na hora do gol, imediatamente sai comemorando, ao contrário de seus outros colegas, que pareceram mais surpresos do que felizes com a reação de Kane.

É uma pena que tudo tenha sido assim, meio obscuro, nada imedito como exige um gol na prorrogação, especialmente um gol que decide um título. Nos últimos vinte anos, quatro títulos foram decididos na prorrogação (1996, 1999, 2000 e agora), e foi a segunda vez que o título ficou "sub júdice" por alguns instantes após o gol — a primeira, claro, foi o famoso patim na área de Brett Hull, lance contestado pelo pessoal de Buffalo até hoje.

Com tudo esclarecido, não sobrou dúvida de que o disco chutado por Kane definitivamente entrou. Só demorou mais do que o ideal. Não diminuiu a festa, porque, bem, um time que estava havia quase meio século em jejum (jejum este que até cinco anos atrás não era sequer o segundo mais longo naquela cidade e ainda não era o primeiro) não vai comemorar menos só porque o disco brincou de esconde-esconde ("A cuca?" "Achou!") com a arbitragem. Só faltou a comemoração espontânea, os cinco a dez segundos em que a explosão ocorre.

E sabe o que é o pior? É que não há o que fazer para impedir que isso aconteça novamente. Ainda que houvesse um chip dentro do disco que avissasse quando ele cruza a linha de gol, além de as máquinas não serem infalíveis, os jogadores no gelo não saberiam de imediato o que aconteceu. Afinal, se eles tivessem percebido o gol de Kane no exato instante em que ele aconteceu, todos só estariam tirando sarro dos locutores — e ninguém diria que não viu o disco entrar.

O fato é que o disco entrou e a situação em questão dificilmente acontecerá novamente, ao menos não na prorrogação de um jogo decisivo. Sempre que se falar neste título dos Hawks, o gol de Kane será lembrado, mas vai entrar para a seção de curiosidades da Copa em qualquer livro que trate do tema. Assim como, olhando para trás, agora fica a impressão de que o título estava nas mãos dos Hawks desde o início, sem os percalços das duas primeiras séries e o pessimismo quase palpável da torcida do time após os dois primeiros jogos na Filadélfia.

Porque esse tipo de impressão só é deixada por um campeão digno. E, para conquistar um título com dignidade, pouco importa como foi marcado o gol decisivo. Basta o disco ter entrado. Foi o que aconteceu na quarta-feira, não?

Alexandre Giesbrecht, 34 anos, tem comido mais sanduíches do McDonald's do que deveria.
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Página publicada em 12 de junho de 2010.