8 de maio de 2002
Velharias e quinquilharias são sempre muito valiosas

Por Fabiano Pereira

Quantos anos você tem? 10? 20? 30? 40? Bem, independente de sua idade, imagine-se com 39, 40, 41 anos. Se você já tem, ótimo, nem precisa imaginar. Agora, diga-me o que você vê. Uma família, filhos, um emprego convencional. Talvez um escritório, com secretária. Talvez um profissional liberal. Um cachorro, dois carros, uma casa confortável. Mas você consegue se imaginar patinando avidamente em um rinque, jogando seu corpo contra o de outras pessoas, manejando um taco, passando e chutando um pequeno disco de borracha, estourando seu corpo, levando porradas de todos os lados?

Pois bem. Algumas pessoas, aos 40 anos, têm isso como seu motivo maior de vida. São jogadores de hóquei e, apesar de serem estrelas, ainda querem jogar, por simples amor ao esporte a que se dedicaram. 82 jogos numa temporada, lá estão eles, com suas barbas já atingidas pelos fios brancos. Seus corpos já não são os mesmo de suas juventudes, mas sabem jogar com muita inteligência e, principalmente, sabem liderar.

Aos 40 anos e algumas temporadas não muito boas, o defensor do Detroit Red Wings, Chris Chelios, enfrentava um grande dilema: parar ou não de jogar? Após uma temporada onde jogou apenas 24 jogos, parecia que este defensor não tinha muito a oferecer. Não? O que dizer então, de 79 jogos, 39 pontos, um +/- de +40, e principalmente, uma indicação para o Troféu Norris, de melhor defensor da liga? Nada mal para este bravo guerreiro que, mesmo com o corpo arrebentado, ainda continua a atazanar a vida daqueles que tentam ficar na frente de seu goleiro. Jogando seu corpo em cima dos advesários, batalhando pelo disco nas bordas e ainda com alguma contribuição ofensiva. Além de ter sido um dos principais jogadores na conquista da medalha de prata pelos Estados Unidos, nos jogos de inverno. Acho que chega, não?

Aliás, os Wings são conhecidos por ser o time mais velho da liga. Grande parte desta estatística está na idade de Igor Larionov, 42 anos, o jogador em atividade mais velho. Mas Larionov não completa apenas o banco ou entra ocasionalmente. Ele é peça fundamental no esquema de jogo dos Wings, servindo com maestria os asas finalizadores do time, além de segurar muito bem o disco. Pode-se dizer que os Wings já têm Yzerman e Fedorov de centrais, mas a experiência de Larionov é imprescindível. E Scotty Bowman sabe disso e confia em todos os seus veteranos. Mesmo que já tenham passado dos 35.

Quem passou dos 35 também foi o central dos Hurricanes, Ron Francis. E calmamente, sem muito alarde, como é seu estilo, ele simplesmente passou dos 1.600 pontos e completou 39 anos. Mesmo com seus cabelos grisalhos e aparência de senhor de meia-idade, toda noite que seu time entra no gelo, lá vai ele, dar o possível pelo time. Marcar gols, fazer passes, mas, principalmente, liderar por seu exemplo. Você jamais ouvirá Francis gritar com sua equipe, mas, se precisarem de um gol, para vencer ou empatar, pode ter certeza: virá das mãos mágicas deste respeitável senhor. E bem respeitável, pois é venerado tanto pelos torcedores de Raleigh, quanto por seus companheiros de equipe.

Respeito é algo que Mark Messier conquistou em todas as equipes por que passou. Mesmo com seus 41 anos, ao perguntar para os torcedores de Edmonton ou dos Rangers (e de muitas outras equipes) qual é um dos maiores capitães de todos os tempos, a resposta será: o Messias, responsável por cinco títulos dos Oilers em Edmonton (um sem Gretzky) e pelo fim da seca de 54 anos sem a Stanley Cup no Madison Square Garden. Após sua contusão nesta temporada, sua liderança fez falta na equipe, que pareceu ter perdido o rumo e, mais uma vez, não se classificou para os playoffs. É inquestionável a liderança de Messier em uma equipe. Gritando, colocando seus companheiros contra a parede, o velho guerreiro (não é o Chacrinha), parece ter mais gás, pois ainda não está claro se volta ou não para a próxima temporada.

Poderiam ser ditas muitas coisas de tantos outros jogadores, como John Vanbiesbrouck, Doug Gilmour, Dave Andreychuk, Kevin Dineen, Gary Suter ou Steve Thomas, mas todos nós sabemos o valor que os mais velhos têm em qualquer instituição em nossa vida: trabalho, escola, vida. E, para os times de hóquei, esta máxima também vale.

Fabiano Pereira estava ouvindo Phil Collins quando terminou este artigo. E, convenhamos, o Phil Collins não é lá muito novo também.
 
Edição atual | Edições anteriores | Sobre The Slot BR | Contato
© 2002 The Slot BR. Todos os direitos reservados.
É permitida a republicação do conteúdo escrito, desde que citada a fonte.
Página publicada em 6 de maio de 2002.