Por: Jacy Borreaux

*** Atenção! O conteúdo informativo (?) do artigo abaixo é de total (ir)res-ponsabilidade de seu idealizador e não reflete necessariamente a opinião da Revista TheSlot.com.br, portanto qualquer ofensa ou agressão física deve ser direcionada para o autor da mesma. ***

Amigos, ainda não me recuperei do impacto. Ao receber um e-mail da alta cúpula de TheSlot.com.br não pude conter minhas histéricas gargalhadas ao ver, numa mesma frase, as palavras "Toronto Maple Leafs" e "Copa Stanley". Algumas horas depois, já refeito do misto de susto e humor desenfreado, consegui ler o resto do parágrafo. Eles, os editores, fiéis aos seus costumeiros projetos megalômanos, queriam que eu fosse ao Canadá, mais especificamente a Toronto, para cobrir a festa que os Maple Leafs organizariam para os jogadores que atuaram em sua última Copa Stanley conquistada.

Se o nobre leitor não se lembra dessa última conquista dos Leafs, não se culpe, ela aconteceu há exatos 14.539 dias, ou 2.077 semanas, ou praticamente 40 anos. Isso, como vocês dizem aí no Brasil, é tempo pra cacete.

Assim que recebi essa "encomenda", procurei saber mais sobre essa confraternização. De fato, homenagear heróis de tão longínqüo título até me sensibilizou. Então liguei para a CFMJ - 640 AM de Toronto e perguntei em que cemitério iria se realizar a cerimônia e se poderia enviar uma coroa de flores em nome de TheSlot.com.br e seus leitores. Bem, me surpreendi quando o atendente da rádio me disse que a homenagem seria no Air Canada Centre antes da partida entre Maple Leafs e Edmonton Oilers, e que contaria com remanescentes daquela última volta olímpica.

Minha surpresa residiu no fato daquele time ter sido um dos mais "velhos" a vencer uma Copa, tendo inclusive quatro jogadores com 40 anos ou mais. Então perguntei ao funcionário da rádio se não seria desagradável e anti-ético paleontólogos desenterrarem Terry Sawchuk, Tim Horton, etc., e levá-los para o Air Canada Centre. O malcriado, reconhecendo meu sotaque franco-canadense, me chamou de caipira inculto e me mandou ordenhar vacas em Quebec.

Era esse clima adverso que estava me esperando no grande e gélido norte. O pior é que não tive escolha, até porque dificilmente algum outro membro dessa revista semanal de hóquei conseguiria visto de entrada no Canadá, afinal eles — os canadenses — levam muito a sério esse lance de longos históricos penais, ainda mais se neles constar casos como atentado grave ao pudor, abuso de bebidas alcóolicas, violência contra autoridades e influência negativa para centenas de jovens fãs da NHL. Não que a minha ficha seja a mais limpa do que a deles, os colunistas Sloteanos, mas como sou de Deux-Montagnes, Quebec, nunca é complicado voltar a meu país de origem.

Assim que desci do avião e coloquei os pés no solo de Mississauga, região metropolitana de Toronto, fui reconhecido pelas autoridades locais. Eles reconheceram de longe minha áurea de superioridade, afinal quando se torce para um time com duas dúzias de Copa Stanley na estante você não consegue disfarçar isso. Fui levado a uma sala azul, com um pôster gigantesco de Wendell Clark na parede.

O funcionário da alfândega perguntou o que eu fazia em Toronto, então respondi que estava a serviço de uma revista brasileira sobre a NHL. O anormal riu de chorar, achando se tratar de uma piada, mas quando viu que eu falava sério, me perguntou desde quando índios sabem o que é hóquei. Estão vendo, amigos, essa a visão que o povo de Toronto tem de vocês.

Mas o pior estava por vir. Em seguida o mesmo alfandegário perguntou se eu tinha algo a declarar, o que é um procedimento normal em aeroportos. "Opa, isso vai ser bom", pensei com meus botões. Então declarei em alto tom que Doug Gilmour — ídolo maior deles — não serviria nem para amarrar os patins de Maurice Richard ou Guy Lafleur; e declarei também que o nível de coeficiente intelectual do povo de Toronto é tão baixo que tiveram que eleger um ex-atleta dos Canadiens — Ken Dryden — como presidente da franquia; por fim, declarei que sempre achei as rosquinhas das lanchonetes Tim Horton uma bela duma porcaria.

Amigos, eu não deveria ter feio isso! O alfandegário começou a berrar e me indagar como eu tinha a ousadia de falar mal das rosquinhas das lanchonetes Tim Horton na frente dele! Então eles me torturam, amigos. Foi cruel, cruel demais. Me obrigaram a assistir uma velha fita VHS onde Tie Domi, nu no vestiário do já extinto Maple Leafs Gardens, recitava poemas de Oscar Wilde. E depois um documentário sobre a vida e obra de Sergei Berezin, incluindo o processo, passo a passo, de como ele cuidava de seu mullet (?) e de sua amizade com Steve Thomas.

A tortura só acabou quando assinei uma petição favorável a introdução imediata de Doug Gilmour, Dave Andreychuk, Wendel Clark e Felix Potvin no Salão da Fama do hóquei.

Livre daquele inferno, ganhei as ruas de Mississauga rumo a Toronto. Demorei duas horas para conseguir um táxi, já que entre meio-dia e três horas da tarde todos estão ajoelhados em direção à casa de Tie Domi rezando.

Por falar em Domi, existe no centro velho de Toronto o DomiTown. É um lugar de caos, onde todos veneram essa figura peculiar. E também onde amaldiçoam a existência do grande satã, também conhecido como Sandy McCarthy. Pra quem não se lembra, há algumas temporadas Domi fez comentários depreciativos acerca da raça do então atleta dos Flyers. McCarthy convidou Domi a resolver as diferenças como dois homens civilizados: no braço. Mas Domi preferiu correr. McCarthy então ridicularizou o ato covarde de Domi, fazendo a "dança da galinha" toda vez que encontrava Domi nos gelos da NHL, e por isso o simples ato de pronunciar "Sandy McCarthy" gera calafrios por aqui. É o mesmo que falar "pensão alimentícia" na redação de TheSlot.com.br.

No caminho do ACC, aqueles quatro dígitos — 1967 — não saíam da minha cabeça. Mas não conseguia exatamente entender o quão distante isso foi, afinal não tenho uma boa noção de tempo. Por isso resolvi fazer uma pequena lista, onde eu pudesse depois comparar o mundo do hóquei e outros aspectos do planeta em 1967 com o mundo atual, a fim de me situar.

O ano de 1967 foi o último da era dos Seis Originais — Montreal, Chicago, Detroit, New York Rangers, Boston e Toronto. Na temporada seguinte a NHL dobraria de tamanho, com seis novos times adicionados — St. Louis Blues, California Seals, Philadelphia Flyers, Minnesota North Stars, Pittsburgh Penguins e Los Angeles Kings.

Agora estamos em 2007 e o Minnesota North Stars, o California Seals e o Philadelphia Flyers já não existem mais. Ou quase isso.

Esse dado me faz chegar a uma conclusão óbvia: desde que a NHL passou a ser um clube menos exclusivo os Leafs não sentem o gosto de erguer uma Copa Stanley. E sabem a quantas finais de Copa eles chegaram desde aquela noite de 2 de maio de 1967? Ai, caramba! Minha memória me abandona às vezes. Por Maurice Richard, qual é mesmo aquele número que vem antes do um? Aquele de forma arredondada, aquele mesmo, que quando posicionado à esquerda não vale nada? Aquele que significa ausência de valor? Ah, lembrei: ZERO!

Em 1967, o Chicago Blackhawks era uma instituição de hóquei. Contava com Bobby Hull, Stan Mikita e Phil Esposito. Três lendas imortais do hóquei. Estamos em 2007 e o dono da franquia, "Dólar Bill" Wirtz, é tão inepto que foi chamado de ignorante pelo nosso colunista mais obscuro. Sem falar que o capitão do time na atualidade é Adrian Aucoin, então é melhor parar por aqui.

Em 1967, homens gostavam de mulheres. Em 2007 a maioria deles faz as unhas, toma banhos diariamente, assiste a novelas, alguns torcem pelo Colorado Avalanche e, pasmem, uma parte considerável deles coloca pôsteres de Vince Lecavalier na parede do quarto.

Em 1967, o mundo assistiu ao golpe de estado e implantação na Grécia da ditadura militar chefiada por George Papadopoulos. Estamos em 2007 e hoje a Grécia respira democracia e algo que não consigo identificar direito, mas acho que é Mussakás!

Por falar em grego, em 1967 Christos Kostas Tselio, ou, Chris Chelios, como é mais conhecido, tinha apenas cinco anos e começava a dar suas primeiras patinadas rumo a uma bela carreira na NHL. Agora estamos em 2007 e Chelios curte confortavelmente sua aposentadoria em uma pacata cidade ao sul do estado de Illinois... ham?! Aparentemente o servidor de TheSlot.com.br está me informando que Chelios ainda joga hóquei profissionalmente. Por isso que nunca confiei nesse servidor Made in Moçambique da Redação.

Voltamos a 1967, e os Beatles lançam o aclamado "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band", um dos álbuns mais cultuados da história do rock. Estamos em 2007, John Lennon virou pó há décadas, mas o Chatuba de Mesquita acaba de lançar mais um álbum proibidão, o conceituado "Bonde do Sexo Anal Vol. 2 — Ao Vivo em São Gonçalo".

Em 1967, Bernie Geoffrion, que havia encerrado sua carreira, aceita retornar à NHL. No mesmo ano, Dercy Gonçalves comemora seu cinqüentenário. De volta a 2007, e Geoffrion tem seu nome posto no teto do Centre Bell; Dercy, desafiando a lógica, surpreendentemente canta "Killing Me Softly" no Johnny Brabo Show.

Em 1967, os Rangers completavam 27 anos sem conquistar a Copa Stanley. Ou seja, estavam a meio caminho andado de sua seca de 54 anos que terminaria em 1994. Em 2007, eles estão a poucas derrotas de ver a pós-temporada na Versus Network, isso se eles conseguirem achar o canal.

Bem, acho que isso é o bastante para percebermos que, toda vez que formos escrever sobre a última Copa Stanley do Toronto Maple Leafs, devemos começar com "Era uma vez...". Acho que nem mesmo eu consigo chegar aos 40 anos, a não ser se encontrar alguém com um fígado compatível. Alguém? Alguém? Por favor...

Voltando a cidade de Toronto.

Quando você chega à arena, no número 40 da Bay Street, você sabe que o time está em uma boa fase por causa do cheiro de naftalina. E essa é uma rua muito agradável de Toronto, já que em um raio de 200 metros você pode se infectar com alguma doença venérea com alguma prostituta porto-riquenha, contrair uma infeção intestinal em barraquinhas de comida paquistanesa ou rir de um anormal que pagou US$ 300 por uma camisa do Wade Belak. É engraçado. Eu juro.

Finalmente, os festejos.

Inicialmente, pensei em fazer uma relação com todos os homenageados do dia e o grau de participação deles na conquista de 1967. Mas isso daria muito trabalho, e muito trabalho é coisa para otários. Além disso, o jornal Toronto Star já fez isso, então esqueça, vou falar apenas do mais esperado convidado, Dave Keon.

Keon atuou profissionalmente por 23 anos, sendo 15 deles com os Leafs. Pelo time de Toronto, foi campeão da Stanley quatro vezes e venceu o Troféu Calder — novato da temporada — em 1961. O ponto alto de sua instância com os Leafs foi justamente em 1967, quando levou o Conn Smythe como jogador mais valioso na pós-temporada. Mas a relação com o time terminou em um divórcio doloroso em 1975, quando divergências monetárias fizeram com que Keon fosse parar na WHA. Desde então, Keon e Maple Leafs permaneceram tão distantes quanto Brasília e a realidade. Até que a reunião que motiva esta coluna reaproximou o velho central do time que o projetou.

Quando foi apresentado, Keon recebeu uma longa ovação, o que foi muito bom, já que enquanto as luzes principais estavam apagadas e as mãos de quase todas as pessoas na arena estavam ocupadas com aplausos, "coletei" cinco potes de "chicken wings" e três galões de Molson Ice!

Mesmo sendo ovacionado, Keon não demonstrou a emoção que todos esperavam. Nada de lágrimas, sorrisos ou discurso inflamado. Mas quem pode culpá-lo? Afinal, o cara foi homenageado pelos Leafs! Se tivesse recebido uma placa de zinco de sua primeira escola pelo D+ que tirou em literatura, em 1952, talvez ele se sentisse mais honrado.

Então é isso, torcedores dos Leafs. Joyeux Anniversaire e Au Revoir, losers!

Jacy Borreaux continuará sua saga pelas arenas da NHL. Sua próxima parada será em Denver, no Colorado, e depois em New Jersey, em... onde fica New Jersey mesmo?
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Equus asinus, mamífero perissodátilo de tamanho médio, utilizado desde tempos pré-históricos como animal de carga e ídolo em equipes fracassadas.
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O filósofo grego e torcedor do Carolina Hurricanes nas horas vagas, Siphodemos, 2530 a.D.D. (antes de Dallas Drake), nos enviou após sua viagem a Toronto durante a pós-tem-porada de 2002 fotos chocantes e exclusivas sobre a nação Leafs. O banner diz tudo. Até eles estão con-formados: Copa Stanley? Nunca mais!
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Eles provocaram e a resposta da torcida dos Penguins foi cruel: 40 anos de frus-tração e contando...
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Página publicada em 21 de fevereiro de 2007.