Por: Thiago Leal

O Diabo de Nova Jérsei traz o "500" na testa
Se é uma coisa da qual a NHL sempre foi bem servida é goleiro. Desde que Jacques Plante e sua máscara de vanguarda chamaram a atenção dos holofotes que os homens debaixo dos paus passaram a chamar tanta atenção quanto os jogadores de linha, coisa inexistente em outros esportes onde temos "gol".

O goleiro na NHL é uma figura destacada, porque faz boa parte do seu trabalho graças a habilidades pessoais e completamente únicas dentro do elenco. Está expondo a todo instante todo o corpo a ser atingido por um pedaço duro e minúsculo de borracha arremessado a velocidade inigualável em qualquer esporte, tendo muites vezes que concertar erros cometidos por seus próprios defensores. Toda essa missão deve ser realizada sob um uniforme pesado que diminui sua mobilidade, além de uma máscara quente que cobre seu rosto. Esse trabalho, somado aos desenhos das máscaras, fazem do goleiro uma figura fascinante para qualquer torcedor.

Depois de heróis como Clint Benedict (primeiro goleiro a usar máscara na NHL), Plante, Bernie Parent, Tony Esposito, Grant Fuhr e Patrick Roy a NHL vive uma fase de grandes goleiros. Temos no gelo atualmente Evgeni Nabokov, Rick DiPietro, Jose Theodore, Roberto Luongo, Jean-Sebastien Giguere, Miika Kiprusoff, Marc-Andre Fleury, Henrik Lundqvist, Ilya Brzgalov, Olaf Kolzig, Nikolai Khabibulin e veteranos Marty Turco, Chris Osgood e Dominik Hasek ainda em forma. Todos listados aqui são jogadores essenciais para seus respectivos times. E é incrível ver que nesse embrolho de craques debaixo dos paus um deles se descata dos demais: Martin Brodeur.

Com sua 500ª vitória conquistada na NHL, o "diabo" segue perseguindo o estigma de melhor goleiro da história da Liga, tendo os recordes de Roy a quebrar no caminho.

Acima de qualquer comparação
Que Brodeur é um goleiro ímpar na NHL, ninguém duvida. A Liga vê no momento outros goleiros como Henrik Lundqvist e Miikka Kiprusoff assumirem a condição de "melhor" goleiro, mas isso em termos de atualidade. Por excelência, dos goleiros em atividade, muitos hão de concordar que Brodeur tem as melhores qualidades — dentre as quais, destaco sua frieza e segurança. Essas características tornam o #30 dos Devils a figura mais importante no esquema amarra-jogo que permeia a franquia desde a década de 90 e lhe rendeu três Copas Stanley. Os defensores e atacantes de New Jersey sempre tiveram a liberdade para atuar num esquema tão frágil e passível de penalidades porque por trás deles está Brodeur, alguém que tem habilidade suficiente para dar conta de um "serviço extra" no caso de desvantagem numérica. Sem falar que seu jeito sereno transmite tranqüilidade ao restante dos patinadores. Dá para atuar de forma mais despreocupada e concentrado no próprio jogo. É diferente de ter um goleiro que solta rebotes, que não tem tanta velocidade na combinação mão-luva/mão-taco ou que não agüenta uma pressão de chutes consecutivos num caso de desvantagem numérica. Ao mesmo tempo que Brodeur apóia o cotovelo nas traves e repousa calmamente, está ciente o bastante do jogo para não se permitir falhar; uma característica que é inversa a José Théodore, por exemplo. Isso faz de Brodeur um goleiro diferente dos outros grandes goleiros da NHL, mesmo na atualidade, e o coloca numa situação própria.

E o mais interessante é que Brodeur encarna essas características mesmo tendo um grande peso sobre cada ombro: a sombra de seu pai, Denis Brodeur, ex-goleiro da Seleção Canadense; e de seu ídolo, Roy, com quem Brodeur sofre comparações à medida que se aproxima de seus recordes. O goleiro dos Devils tira esses dois obstáculos do caminho sem fraquejar em instante algum.

A curiosidade é que Denis Brodeur, depois de encerrar sua carreira como goleiro, passou a trabalhar como fotógrafo de hóquei, para o Montreal Canadiens — de onde surgiu a paixão de seu filho por hóquei, pelos Habs e por Roy.

Números da Besta
A pressão que Brodeur torna em vantagem o acompanha desde cedo. Foi o goleiro mais jovem a atingir a marca de 300 e de 400 vitórias em temporada regular. A 500ª veio na atual temporada e mais 51, Brodeur se iguala a Patrick Roy como maior vencedor da história da Liga debaixo dos paus. A isso ajuda também sua excelente condição física e, aparentemente, vida pessoal. Brodeur não é o tipo de goleiro que preocupa seus torcedores com contusões ou com problemas pessoais que o afaste de partidas. A última vez que atuou por menos de 70 jogos foi na temporada 1996-97 — última vez, portanto, que ficou abaixo da casa dos 4000 minutos no gelo.

O atual segundo goleiro com maior número de vitórias é o terceiro em número de shutouts. São 92 jogos sem tomar gols. Está a 15 de Terry Sawchuk e seus 107 shutouts. Um outro recorde onde persegue Roy é o número de minutos jogados. O ex-goleiro aposentou-se ultrapassando a casa dos 60 mil minutos, enquanto Brodeur passou a pouco a casa dos 52 mil. Mas segura o número de minutos consecutivos no gelo, batido na temporada passada com 4697 minutos sem sair debaixo dos paus. Haja chute na cara!

Os recordes que Brodeur carrega por detrás da máscara impressionam: maior seqüência de temporadas com 30 vitórias, 11; e maior seqüência de temporadas com 35 vitórias, 10. Também detém o recorde de maior número de temporadas com 40 ou mais vitórias, com seis temporadas atingindo ou ultrapassando a marca; recorde de maior número de jogos vencidos numa mesma temporada regular, 48; o goleiro a vencer o maior número de prorrogações, 45; e um fenômeno curioso: único goleiro na NHL a marcar um gol vencedor de um jogo, em 15 de setembro de 2000 contra o Philadelphia Flyers — oficialmente, seu segundo gol na NHL.

Brodeur também traz o maior número de shutouts em pós-temporada, com sete; em jogos de Copa Stanley, com três; e o segundo maior número de shutouts em pós-temporada no geral: 22. Um atrás do líder. Quem? Patrick Roy. Também é o terceiro que mais venceu jogo de pós temporada, com 94 triunfos. Líder, Roy, com distantes 151 — aparentemente, o recorde mais difícil a ser batido por Brodeur e o único que cogito duvidar.

No caminho oposto de Roy
Roy tinha um comportamento explosivo peculiar. Roy tinha um olhar louco e intenso, e isso o ajudou a ser estigmatizado como ídolo e rotulado por muitos como "o maior goleiro de todos os tempos". Eu diria que Brodeur traz uma característica também peculiar... uma frieza que só vi no jogo de Vladislav Tretiak — que foram poucos os que tive acesso, mas me parmitiram perceber uma semelhança com o #30 dos Devils. O muito que Roy conquistou não só com vitórias, mas também por seu comportamento, Brodeur tem que fazer dobrado, por sua frieza não lhe permitir essa empatia com os torcedores da NHL em geral.

E aqui não vou julgar quem é melhor, se Roy ou Brodeur... vou expor um ponto-de-vista pessoal onde, tendo a oportunidade de contar com os dois goleiros, no auge e em forma, desconsiderando fator de idade... preferiria um Brodeur a um Roy no meu time. Isso porque, tendo em vista a excelência dos dois, onde podem se assemelhar, acredito mais na estabilidade de Brodeur e na capacidade de passar essa estabilidade ao time.

Ao mesmo tempo que segue na rota para quebrar uma série de recordes impostos pelo seu ídolo, o goleiro dos Devils tem um esforço dobrado em chamar atenção por sua personalidade serena. Brodeur só pode chamar atenção com números — e é o que a Besta do gol dos Devils tem feito até agora. A cada jogo, somando números à sua carreira. A Bíblia desta besta já foi escrita e chama-se Brodeur — Beyond the Crease. A autobiografia de Brodeur escrita em parceria com jornalista esportivo Damien Cox e com fotos clicadas pelo paixão Denis. Mas, em breve, a autobiografia certamente necessitará de atualizações, com os novos números da Besta.

Thiago Leal tem orgulho de comunicar à comunidade científica sua recente conversão ao ateísmo.
AP Photo/Rusty Kennedy
Karel Rachunek cumprimenta Martin Brodeur com a tradicional tapinha no capacete: 500 vitórias na NHL.
Arquivo TheSlot.com.br
Papai Brodeur! Denis, pai do goleiro, defendeu a Seleção Canadense antes de tornar-se fotógrafo profissional de hóquei no gelo.
Amazon.com
Leia a Bíblia: a autobiografia de Brodeur foi co-assinada pelo jornalista Damien Cox e traz fotos do paizão Denis Brodeur.
Dave Sandford/Getty Images
Brodeur ao lado do ídolo Patrick Roy: no caminho para quebrar todos os seus recordes.
Edição Atual | Edições anteriores | Sobre TheSlot.com.br | Comunidade no Orkut | Contato
© 2002-07 TheSlot.com.br. Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução do conteúdo escrito, desde que citados autor e fonte.
Página publicada em 22 de novembro de 2007.