Por: Alexandre Giesbrecht

Chega a quase ser uma pena eu ter escrito sobre o Evangelho segundo São Anze na semana passada, porque nesta semana escolhi como assunto um outro jogador que merecia ser tema de um evangelho. Como a fórmula está batida por um tempo, eu teria de procurar uma nova figura de linguagem para escrever sobre este personagem, mas a trajetória dele dispensa caprichos semânticos.

Para começar, eu poderia simplesmente contar de um a 500, e já seria uma bela metáfora. Pois bem, imagine que eu comecei a contar agora... Pois bem, agora imagine que eu cheguei aos 500. Pronto, já posso começar a falar do grande Martin Brodeur.

Com sua 500.ª vitória, conquistada no último sábado, contra os Flyers, ele se juntou a Patrick Roy como os únicos goleiros a alcançar tal marca. E o recorde de Roy, 551 vitórias, permanece ameaçado. Brodeur não vai batê-lo nesta temporada, mas tudo está encaminhado para que na próxima temporada a história seja reescrita. O que não estava nos planos é a atuação abaixo da média do goleiro dos Devils em 2007-08.

Quer dizer, abaixo da média para seus padrões, porque muitos goleiros ao redor da liga dariam um braço para ter sua média atual de 2,70 gols sofridos — quanto mais pela média de 2,21 que ele acumulou ao longo de sua carreira (se procurarmos bem no Mercado Livre, é capaz até de acharmos tal oferta). Só o fato de ele ter demorado quatro jogos para passar de 499 para 500 mostra que esta temporada está sendo um pouco diferente do que a torcida de New Jersey está acostumada a ver.

Eu escrevi sobre seu mau começo há um mês, e, embora ele ainda não tenha voltado a ser absolutamente espetacular, seus números já melhoraram muito. Naquela ocasião, sua média de gols sofridos estava em 3,26, com 87,9% de defesas. Este segundo número subiu um pouco, mas ainda está longe dos 91,3% de sua carreira. O que falta mesmo é uma colaboração maior do resto do time, que no fechamento desta coluna ocupava a lanterna da Divisão Atlântico e a antepenúltima posição no Leste.

A partida que deu a 500.ª vitória a Brodeur certamente não foi a mais difícil entre as cinco centenas, justamente porque o resto do time colaborou muito, não só na defesa como no ataque também. Tanto é que no apito final, os 6-2 no placar já tinha espantado uma grande parte da torcida da Filadélfia. Não que os remanescentes tenham ficado impassíveis diante da comemoração dos jogadores dos Devils, que foram cumprimentar seu goleiro enquanto os alto-falantes anunciavam a marca.

É claro que ele foi sonoramente vaiado — "Eles ainda são torcedores dos Flyers", sorriu Brodeur, quando lhe perguntaram se tinha ouvido a reação da torcida —, e não era para menos: 38 das 500 vitórias vieram contra os Flyers, o que faz dele o goleiro mais vitorioso contra eles. E sua relação com o time da cidade do amor fraternal não se encerra por aí. Foi lá também que ele estabeleceu na temporada passada o recorde de vitórias em uma temporada, isso sem falar na sua campanha de 12-1-1 nos seus 14 últimos jogos contra o Philadelphia, incluindo 2-1 nesta temporada.

Se os torcedores locais já não gostam de qualquer jogador que vista uma camisa que não seja laranja, imagine de alguém que já fez tanto estrago.

"Teria sido legal ganhar em casa, especialmente contra algum dos times de Nova York", reconheceu o goleiro. "Mas foi assim que aconteceu, e estou feliz por isso [a perseguição à 500.ª vitória] finalmente ter acabado. Foi uma grande vitória."

Não deixa de ter um pouco a ver com Brodeur, afinal ele é um dos que mais contribui para isso, mas a média de gols da NHL nesta temporada está abaixo da média da temporada passada, que, por sua vez, já estava mais baixa que a média da temporada anterior. Até a semana passada, a média estava em 5,5 gols por jogo, número que tinha ficado em 5,9 em 2006-07, depois da mesma quantidade de partidas. Em 2005-06, a primeira temporada depois do locaute, depois do mesmo número de jogos, a média estava em 6,2.

Gary Bettman, ágil como um cágado e rápido como um caracol, disse que vai continuar a monitorar a situação (que homem de ação!). "O jogo ainda está interessante", declarou o comissário. "Temos visto algumas partidas com vários gols. Mas estamos de olho." Traduzindo: "Enquanto o Comitê Diretor não vir uma luzinha vermelha de pânico acendida por gerentes gerais preocupados, nada vai mudar."

Pode começar a temer o aumento das dimensões do gol. Muitos jornalistas norte-americanos já dão como certo que, se a tal luzinha acender, essa será uma saída que terá um apoio maior do que se imagina. Diminuir o tamanho do equipamento dos goleiros? Muito difícil, por conta da Associação de Jogadores da NHL.

E quem paga o pato?

É aqui que voltamos a Brodeur, justamente um dos goleiros com o menor equipamento desde que entrou na liga. Dá até medo imaginar do que seu talento seria capaz se ele usasse tamanho GG.
Alexandre Giesbrecht, publicitário, acaba de receber um especial da revista alemã Kicker com o guia da temporada 2007-08 do hóquei no gelo da DEL.
Rusty Kennedy/AP
Brodeur faz um de suas 26 defesas no jogo de sábado.
(17/11/2007)
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Página publicada em 21 de novembro de 2007.