Por: Alexandre Giesbrecht

Sentado na terceira fila atrás do banco dos Canadiens, ele tem uma boa visão dos problemas que seu time enfrenta no gelo. É claro que ajuda bastante o fato de ele conhecer o time como poucos. Não exatamente o elenco, é claro, mas a instituição Montreal Canadiens não tem muitos segredos para ele. Falo de Jean Beliveau, um dos ícones da grande geração dos Habitants entre as décadas de 1950 e 1960.

Foi ele que o jornal National Post foi consultar para tentar descobrir o que está errado com o time. Sua resposta não poderia ser mais simples, mas muitas vezes o óbvio mascara a verdade. Para ele, falta que os veteranos do time assumam seu papel de liderar a molecada.

"É injusto que achem que os dois jovens que acabaram de trazer de Hamilton [o defensor Ryan O'Byrne e o atacante Maxim Lapierre] vão salvar o time", avalia Beliveau. "Eles podem ser de grande ajuda, mas precisam da ajuda dos veteranos. Você não traz um jovem e pede a ele para salvar o time pelos veteranos. Tem de ser, como sempre foi, o contrário."

Depois de contar alguns causos de seus tempos de jogador — e pode apostar que, com dez Copas Stanley no currículo, ele tem causos aos montes para contar —, ele cita o gol como outro exemplo desse problema do time. Primeiro, lembra que o goleiro Cristóbal Huet foi um dos principais responsáveis pela classificação dos Habs aos playoffs de 2005-06. Depois, lembra que Huet está contundido, o que jogou a pressão nas costas do novato Carey Price, que tem jogado bem, mas as custas de uma inconstância normal para alguém tão novo.

Difícil discordar de Beliveau. Ele ainda cita brevemente a volatilidade das linhas e uma suposta virilidade limitada a alguns jogadores, também fatores importantes. Acho que, se o Post dispusesse de espaço para mais que 16 parágrafos, a entrevista com o astro de outrora poderia se alongar quase que indefinidamente, ainda mais com meia província de Quebec se questionando sobre o que aconteceu com seu adorado time, que, com a derrota de terça-feira nos pênaltis para o Lightning por 3-2, perdeu sete de seus últimos nove jogos e caiu para o terceiro lugar na Divisão Nordeste. Isso sem falar que perdeu seus seis últimos jogos em casa. Mais uma derrota e igualará o recorde da franquia.

A chave da queda parece ter a ver com o Bell Centre: enquanto a campanha do time em casa é a quinta pior da liga (5-6-4), a campanha fora é a segunda melhor (9-5-1). No sábado, tinha sido a vez de os Hurricanes se aproveitarem dessa hospitalidade, com impiedosos 5-1, que fizeram os 21.273 torcedores que lotaram o estádio vaiar, também sem piedade, seus jogadores ao fim do jogo.

Falta de apoio da torcida não é, porque esse público de 21.273 repetiu-se em todos os jogos em casa. Para o técnico Guy Carbonneau, teria a ver com os visitantes se empolgando para jogar em uma cidade que respira hóquei. Faria sentido, se os Canadiens tivessem sido fundados em outubro. Afinal, fica difícil não lembrar que na maioria esmagadora de suas temporadas na NHL o time teve campanha vitoriosa em casa. Será que essa empolgação toda das visitas só começou agora?

Certamente não. Mas a forma com que Carbonneau tem trabalhado o moral do time faz lembrar muito os técnicos brasileiros que caem de pára-quedas em times ameaçados. Da cartilha do técnico canadense, faz parte aquela famosa frase de não entrar em pânico se o gol não sair nos cinco minutos iniciais. Ou aquela que diz que fora de casa o time joga mais solto, sem a pressão da torcida. Com um time jovem, isso até faz um pouco de sentido.

O que não faz nenhum sentido é a atuação dos matadores de penalidades. Nas últimas 20 chances de vantagem numérica que os adversários tiveram, foram anotados nada menos que oito gols. Um aproveitamento de 40% de fazer inveja a qualquer jogador de beisebol. Com a disciplina em baixa, o time tem cometido mais penalidades que no início da temporada, e a fórmula para equacionar o desastre começa a se delinear.

Mas Carbonneau está longe de ser Baskhara. Ele até tenta, com uma filosofia pouco embasada na realidade. "Ultimamente, tem sido difícil para nós assumir a liderança do jogo", explica. "É sempre mais fácil defender em desvantagem numérica quando se está na frente do que quando se está perdendo por um ou dois gols." Não se parece muito com b2 - 4ac. E soa muito mal para alguém que já ganhou três Troféus Selke.

Já o contundido Huet, que não deve voltar antes da semana que vem, oferece uma explicação mais ácida e até surpreendente. Para ele, os Habs são um time frágil. Na semana passada, ele ainda questionou a inteligência coletiva do time, em uma frase que não ganhou tanto destaque quanto se esperaria: "Nós somos um pouco fracos entre as orelhas." Bem contundente.

Dizem que quem não conhece a história está destinado a repeti-la, então talvez seja a isso que Huet se refere. No ano passado, o Montreal começou muito bem a temporada, mas, quando trocaram o calendário na parede, o embalo acabou e o time sequer alcançou os playoffs. Neste ano, o fôlego está começando a faltar mais cedo.

Ou isso ou o que mantém os Canadiens na briga são os arqui-rivais Bruins. Só nestes dois primeiros meses de temporada, foram quatro jogos contra o time de Boston, com quatro vitórias canadenses. Sem esses oito pontos, os Habs estariam não só na lanterna do Leste, como também na lanterna da liga — isso sem falar que os Bruins liderariam com folga o Leste, mas aí é tema para outra coluna.

A melhor solução que posso oferecer para Carbonneau e seus comandados é tentar subornar alguém na NHL para mudar a tabela e marcar os 52 jogos restantes contra os B's, preferencialmente fora de casa.
Alexandre Giesbrecht, 31 anos, acha que jogar futebol debaixo de chuva forte está entre as dez melhores coisas da vida.
Bruce Bennett/Getty Images
Graças à contusão de Huet, a pressão caiu sobre Price, que tem sido inconstante como qualquer goleiro novato.
13/11/2007
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Página publicada em 12 de dezembro de 2007.