Por: Alexandre Giesbrecht

De todas as maneiras que alguém pode pensar para levar seu time ao topo de sua divisão, talvez nenhuma seja tão criativa como a que os Penguins imaginaram. Nem tão suicida.

O princípio ativo da fórmula é ver seu astro — que, por acaso, é o atual MVP e artilheiro da liga — sair contundido de uma partida, com perspectiva de ficar de molho por coisa de dois meses. Não tentem usar isso na aula de Química, crianças! Especialmente porque vocês não terão à mão o outro ingrediente necessário para que todo não se evapore ao ser aquecido no bico de Bunsen.

Esse outro ingrediente foi cuidadosamente produzido em Magnitogorsk, Rússia, e, até onde se sabe, não é mais fabricado. Afinal, como seu Vladimir e dona Natalia já fecharam a lojinha, o próximo Malkin a sair do forno deverá ser o primogênito de Evgeni.

Quando Malkin foi recrutado, em 2004, pouco antes do locaute, ele era considerado o único jogador de destaque daquele recrutamento. Ainda assim, foi escolhido em segundo lugar, porque havia à sua frente um semideus de nome Alexander Ovechkin, que conseguiu ofuscar até o potencial de Malkin. Os Penguins ficaram com a segunda escolha por perderem o sorteio da loteria da NHL para os Capitals e, na falta de Ovechkin, contentaram-se com o que "sobrou".

Uns poucos cometeram o disparate de comparar Malkin a Ovechkin. Alguns deles, inclusive, foram imediatamente internados depois de dizer que Malkin era o melhor dos dois. Por mais que essa afirmação ainda hoje pareça meio estranha, ela está longe de ser um disparate depois do que Malkin fez nas últimas semanas.

Crosby contundiu-se em um lance bizarro contra o Lightning em 18 de janeiro. Até então, os Penguins nunca tinham vencido uma partida sem ele no elenco. Não que tenha havido muitas situações parecidas, mas ele ficara de fora de quatro partidas em suas duas primeiras temporadas na NHL. O prognóstico de seis a oito semanas no estaleiro projetava uma queda livre para o time, o que foi ressaltado pela performance no jogo em que Crosby se machucou: sem ele no gelo, os Pens perderam para o lanterna por 3-0.

Curiosamente, na partida seguinte o time foi bastante aguerrido e arrancou uma vitória por 2-0 em Montreal, uma cidade normalmente hostil para as aves esfenisciformes. O reinado de Malkin começou já aí, com um gol. Em seguida, os Capitals foram recebidos em Pittsburgh com muitos gols (cinco), mas nem isso evitou a derrota dos Penguins nos pênaltis. Nem isso evitou que Malkin tivesse mais uma boa atuação, com dois gols e uma assistência.

Depois de uma derrota e uma vitória, cada uma com um ponto do russo, os Pens esqueceram-se de entrar no gelo em Atlanta e foram goleados por 4-1, em um jogo que não foi tão parelho como o placar indica. Malkin não pontuou, mas esse jogo parece agora fundamental para a campanha do Pittsburgh.

Essa não foi a última derrota do time, mas foi a última vez que o atacante marcou menos de dois pontos em um jogo. Nas cinco partidas seguintes, foram quatro gols e 11 assistências: ele marcou três pontos em três dos cinco jogos e quatro em um dos outros. Essa seqüência flamenjante colocou-o, até o fechamento desta edição, a apenas três pontos do artilheiro da liga, justamente Ovechkin, e com um jogo a menos.

"Depois que o Sid se contundiu, houve uma enquete na TSN [emissora de esportes canadense]", conta o zagueiro Brooks Orpik. "Os Penguins vão melhorar, ficar na mesma ou ficar de fora dos playoffs? E todo mundo votou dizendo que ficaríamos de fora dos playoffs. Acho que todos no time deram um pouco mais de si, mas ele é o que explodiu e realmente melhorou suas atuações — não que ele estivesse jogando mal antes. Ele vai ser o primeiro a admitir que está jogando o melhor hóquei de sua carreira."

A produtividade de Malkin ajudou ainda a propelir sua linha: a linha, que ainda reúne Petr Sykora e Ryan Malone, tem um total de 47 pontos nos dez jogos desde a contusão de Crosby. Antes, ele não estava indo mal, com um ritmo em que deveria ao menos igualar sua campanha do ano passado, quando ganhou o Troféu Calder como melhor novato da liga, com 85 pontos. A 26 jogos do fim da temporada, ele está a apenas 12 pontos de igualar a marca.

Se o Troféu Art Ross parece viável, não se pode descartar também um eventual Hart. O troféu é dado para aquele jogador que é considerado o mais valioso para seu time ao longo da temporada, e é justamente isso que Malkin está sendo para os Penguins neste instante.

Todo esse papo faz até parecer que talvez Malkin não se sentisse muito bem ao lado de Crosby e que só pôde brilhar agora porque o outro central não está mais dividindo o gelo. A possibilidade é até plausível, porque Malkin não faz confidências a ninguém da imprensa, e mesmo sua "linguagem corporal" é difícil de se entender, já que sempre que ele dá declarações é seu intérprete, geralmente George Birman, que traduz para o inglês. Como o russo não é uma língua que muita gente fala — ainda mais nos Estados Unidos, onde poucos têm um segundo idioma —, não se sabe a quê são direcionados eventuais olhares tortos ou suspiros, isso sem falar que não se pode descartar a hipótese de que Birman "filtre" alguma eventual declaração de impacto.

Esse argumento dá combustível ainda a uma teoria da conspiração que daria conta da saída de Malkin ao final de seu contrato, supostamente devido a uma insatisfação com o posto de "segunda estrela" dos Penguins. De novo, é uma possibilidade plausível, porque o teto salarial informal dos Penguins é de US$ 8,7 milhões, igual ao salário de Crosby a partir da próxima temporada, abaixo do teto oficial da liga — que deve aumentar nas próximas temporadas, enquanto o salário médio da estrela ficará igual.

Com isso, o time teria poucas chances de igualar uma oferta externa de valor máximo e teria de se contentar com cinco escolhas de primeira rodada. Não exatamente um mau negócio, mas longe de ter o mesmo retorno no curto prazo do que Malkin promete.

Por enquanto, tudo isso não passa de especulação. O próprio Malkin deu sua opinião (traduzida por Birman) quando lhe perguntaram, brincando, se suas últimas atuações deveriam ter convencido o gerente geral Ray Shero a trocar Crosby antes do dia-limite de trocas, em 26 de fevereiro: "É impossível. É muito difícil jogar sem ele. Ele é o líder do time, e mal podemos esperar pela volta dele ao gelo."

O enredo ainda vai demorar um pouco para ser elaborado e promete algum suspense nos próximos 18 meses, embora nada que se compare à verdadeira história de espionagem que envolveu a chegada do russo aos Estados Unidos em 2006. Antes disso, Malkin tem de se preocupar é com o fato de ilustrar a capa desta semana de TheSlot.com.br. Neste exato instante, os Penguins perdem em casa para os Bruins por 2-0.

Alexandre Giesbrecht, 31 anos, está quase acabando de ler Dias: A Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960, biografia de Roberto Dias, que recomenda.
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Página publicada em 13 de fevereiro de 2008.