Por: Thiago Leal

O que vou dizer agora vai parecer contraditório. Parecer, mas não será. Mas hóquei é um esporte bruto e violento demais em algumas jogadas e atitudes. E isso parece contradição porque eu sempre fui um defensor do hóquei duro (e não do hóquei covarde). Pois bem. Continuo sendo. Pra mim hóquei tem que ser jogo duro, áspero. E acho que as jogadas violentas fazem parte do jogo.

Mas e daí?

Daí que muitas vezes, certas jogadas violentas em excesso acabam passando despercebidas. Ou têm punições brandas demais para a gravidade da agressão. E a própria NHL é, por muitas vezes, omissa a discutir temas como violência, brigas no esporte... casos como a agressão de Adam Graves em Mario Lemieux há quase 20 anos atrás ou mesmo o pisão covarde de Pronger em Ryan Kesler. Infelizmente esses casos são encarados com obscuridade por parte da Liga e do(s) comissário(s).

E quando um dilema moral entra em questão? Bom... aí a coisa é bem diferente. Pelo menos do ponto de vista da NHL. Nesse caso, a Liga, provavelmente "em nome da família americana" entra no rinque e se pronuncia com facilidade. E, como todos nós bem lembramos, o último a quebrar essa moral foi Sean Avery, no caso envolvendo uma declaração sobre suas ex-namoradas. O assunto foi comentado aqui na revista, com abordagens diferentes.

Para os que não quiserem ou não tiverem tempo de ler os artigos citados, vamos resumir. Avery namorou a modelo Rachel Hunter e a atriz Elisha Cuthbert. Atualmente Hunter é noiva do atacante dos Kings, Jarret Stoll; e Cuthbert namora o defensor dos Flames, Dion Phaneuf. Isso fez com que, ao ser abordado pela imprensa canadense, Avery declarasse que estava se tornando comum na NHL os homens se apaixonarem por suas, digamos, sobras. Em inglês Avery usou sloppy seconds, um termo mais ofensivo. Obviamente a declaração causou polêmica. A NHL classificou seu comentário como inaceitável e antisocial. Avery foi punido por seis jogos.

Olhando agora, mais de dois meses depois do incidente, mantenho a mesma posição: que tempestade num copo d'água! Tudo bem que o comentário de Avery não foi nada educado, mas isso se resolve com uma coisa chamada multa. E pronto. Tudo resolvido. Mas é ainda mais incompreensivo o que aconteceu com o jogador dentro do próprio clube: Avery foi recusado pelos companheiros de equipe (?). Quando a punição foi imposta, Tom Hicks, dono do Dallas Stars, anunciou que concordava com a mesma e que caso a NHL não o punisse, os próprios Stars puniriam. Mas não imaginei que fosse chegar a tanto. E o pior: não imaginei que o próprio elenco iria rejeitar Avery. Uma coisa é o dono do clube se pronunciar oficialmente. Outra são os colegas nos vestiários. Achei que os comentários seguiriam a linha do "Pô, Avery! Também a Elisha é gostosa... quem não pegaria?". OK, me desculpem os mais puritanos, mas é assim que funciona. Não estou sendo machista, até porque não quero ofender possíveis leitoras. Nem mesmo concordo com o que Avery falou. Mas vai me dizer que quando tem um bando de homens reunidos, não é assim que se comenta sobre uma mulher bonita?

Então o Dallas simplesmente abre mão de Avery e declara que ele não jogará pelo restante da temporada. Uma atitude burra.

Pergunto:

1. Jogador de hóquei pode dar tranco em outro; arrancar dentes; provocar brigas; cortar o supercílio... mas em se tratando de uma declaração machista, ele torna-se moralista? OK, provocar uma briga é permitido. Falar sobre uma mulher de um modo machista não? Você pode agredir um jogador. Mas não pode falar uma bobagem?

2. Declaração extra-campo marca gols? Pensei que Avery tivesse sido contratado para render no rinque, não no microfone.

Lembrando, novamente, não concordo com Avery. Mas isso é hóquei, não é Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Saio agora em defesa do jogador. Avery é o tipo de atleta que a NHL precisa — no rinque. No meu artigo da semana passada, quando disse que os Rangers procuraram alguém com as mesmas características de Adam Graves, cheguei a escrever: (Sean Avery? Nunca!). O "nunca" é porque Avery não se compara a Graves. Mas o citei porque era o que os Rangers queriam quando o contrataram. Avery é um jogador pequeno (1,78m) que joga com valentia. Não tem medo de tranco, não tem medo de partir para o ataque em velocidade. É o típico atleta bravo que poderia se enquadrar numa definição inédita: um intimidador-técnico-ofensivo. Ofensivo porque o dever de um intimidador é proteger. O de Avery é atacar. Técnico porque ele tem mais talento que um intimidador natural.

Então você assina com um agente livre com essas características para depois dispensá-lo porque ele chamou duas ex-namoradas de sobras? Sugiro ao gerente geral e ao dono do Dallas Stars que larguem a NHL. Vão trabalhar com recursos humanos em alguma ONG!

Colocado na lista de transferências, Avery foi requisitado pelo Hartford Wolf Pack, menor do New York Rangers na AHL. Isso, obviamente, sem ser jogador de nível da NHL. O que significa que Avery logo pode ser requisitado pelos New York Rangers? Depende. Avery faz parte do Dallas Stars, não do New York Rangers. Ele foi emprestado ao Wolf Pack, portanto oficialmente não existe ligação com os Rangers. Mas, obviamente, para que a equipe menor se interessasse, existe uma possibilidade de Avery retornar aos Rangers. Glen Sather, gerente geral dos Rangers, foi quem intermediou a negociação, uma vez que o Wolf Pack é parte da Organização New York Rangers. Em sua declaração, Sather fez questão de dizer que Avery ainda é parte do Dallas Stars. Mas comentou sua boa fase pelos Rangers, quando defendeu a franquia, e prosseguiu afirmando que qualquer comentário a mais seria precipitado.

Avery de camisa azul novamente?

Para isso, precisa de duas coisas: jogar bem e controlar melhor sua personalidade. A primeira parte Avery sabe muito bem. A segunda, esta providenciando, uma vez que passou a fazer tratamento terápico para, digamos, acalmar o seu ânimo, sempre exaltado.

Caso retorne aos Rangers, Avery terá papel importante na briga por gelo na pós-temporada. O time, que já chegou a liderar a Liga atualmente vem sofrendo para manter saldo positivo, uma vez que o ataque produz pouco e a defesa não tem parado tanto quando deveria — faz um bom trabalho, mas para um ataque que não rende tanto, se basear na defesa seria importante. Por isso Avery se encaixaria perfeitamente no time. Um jogador perfeito para matar desvantagens numéricas. Um atacante que não é tão efetivo assim em pontos, mas tem força para levar o time ao ataque; fôlego para voltar e defender. Bloqueia chutes, protege, ataca, fornece assistências. Marca gols. Como é mesmo? Intimidador-técnico-ofensivo.

Só lembrando que Avery está na folha de pagamento do Dallas Stars até 2012. Bom, se preocupar mais com sloppy seconds que com teto salarial? Muito bem, rapazes!

Thiago Leal está saindo de casa para encontrar com seus colegas de curso pela primeira vez fora da faculdade.
AP
Avery treina com o Wolf Pack. Uma possível volta ao New York Rangers?
(25/01/2009)
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Página publicada em 11 de fevereiro de 2009.