Temporada 2003. O Detroit Red Wings classifica-se como o segundo
melhor time da Conferência Oeste da NHL, enfrenta o Mighty
Ducks of Anaheim na primeira rodada dos playoffs e é surpreendentemente
eliminado sem sequer vencer um jogo.
Temporada 2004. Desta vez os Red Wings são os melhores
da liga, vencendo o Troféu dos Presidentes. Enfrentam o
Nashville Predators que pela primeira vez em sua história
classifica-se para os playoffs, eliminando-os em seis complicados
jogos. Na segunda rodada o adversário é o Calgary
Flames. Mais seis jogos e com um par de 1-0 nos dois últimos
os Flames eliminam os favoritos ao título.
Temporada 2006. Ainda melhores que em anos anteriores, os Wings
vencem novamente o Troféu dos Presidentes, com a 5.ª
melhor campanha em temporada regular de todos os tempos da NHL.
Enfrentam o Edmonton Oilers e seus 29 pontos a menos na classificação.
A pouco mais de doze horas do terceiro jogo da série, o
placar está empatado em 1-1 e o momentum está
a favor do time canadense.
Se você é fã dos Red Wings conhece a história
acima muito bem. E não tem qualquer dificuldade para apontar
as muitas semelhanças existentes entre as derrotas de 2003
e 2004 e a série atual contra o Edmonton, que na verdade
é o que preocupa.
O que Anaheim, Nashville, Calgary e agora Edmonton fizeram é
adotar o criticado porém eficiente estilo da armadilha
da zona neutra (trap) para frear o tradicional jogo do
Detroit baseado na troca de passes e no controle do disco. E assim
as partidas seguem à mesma maneira: os Wings metralham
o gol adversário, criando poucas claras jogadas de gol,
enquanto o outro time apenas se defende com muito empenho. E então
em uma oportunidade, um erro dos Wings ou uma vantagem numérica,
eles marcam um gol e voltam a se defender.
Uma das saídas para derrotar esse estilo de jogo baseado
na defesa é rifar o disco e batalhar por ele nas bordas
(dump & chase). Mas os Red Wings carecem visivelmente
de velocidade e força física, o que não é
novidade há anos. E após toda uma temporada sem
praticamente enfrentar tamanha disciplina tática, os jogadores
não sabem como derrotá-la.
O elenco de 2002, com Scotty Bowman à frente, consagrou-se
por demolir a armadilha da zona neutra sem constituir seu jogo
em simplesmente rifar o disco e persegui-lo. Naquela ocasião
os Wings perderam os dois jogos em casa contra o Vancouver Canucks
e venceram a série por 4-2, liderados pelo Capitão
Steve Yzerman. É esse o exemplo que deve permear a mente
dos jogadores daqui pra frente. O problema é que Yzerman,
embora seja o melhor atacante dos Wings série, não
consegue carregar o time nas costas como fez em outras oportunidades,
assim como contra os Canucks quatro anos atrás.
A impressão da torcida ao ver o time fracassar perante
adversários notavelmente inferiores é que falta
coração e garra aos jogadores, e no hóquei
isso às vezes influencia mais o resultado que o talento
em si. Não é a sensação absoluta após
os dois jogos contra os Oilers, mas ficou claro nos anos anteriores
que era exatamente isso que faltava. Coração. Exceto
para Yzerman, claro.
E aí entra o desespero, que normalmente é maléfico,
embora também possa ser benéfico. Pavel Datsyuk,
artilheiro do time na temporada regular, pediu para jogar no domingo
após perder vários jogos por contusão na
coxa. Mike Babcock não iria escalá-lo, mas atendeu
ao pedido do jogador. Todos na Joe Louis Arena viram que Datsyuk
não estava pronto e o russo nada fez na partida.
Sem Datsyuk — ou com ele meia-boca — os Oilers podem
se concentrar em parar Henrik Zetterberg, melhor atacante dos
Wings. E têm feito isso com sucesso, embora o sueco tenha
marcado um gol no segundo jogo.
Se Datsyuk e Zetterberg não forem fenomenais como na temporada
regular, então a corrida dos Red Wings nos playoffs não
irá muito longe. E aí é importante lembrar
a novela da renovação de contrato de Datsyuk na
última pré-temporada, quando alavancou US$ 3,9 milhões
em salários por dois anos, mesmo nunca tendo provado seu
valor em playoffs. A título de comparação,
esse é o salário que o Colorado Avalanche paga a
Milan Hejduk, que não tem nada mais a provar.
O que fica na memória dos dois primeiros jogos é
que, em um, os Red Wings dominaram completamente o adversário
para vencer apenas na segunda prorrogação com um
gol em um chute inesperado de Kirk Maltby vindo das bordas laterais,
e em outro, o domínio foi menor e perderam sofrendo dois
gols em 57 segundos, ambos em falhas da defesa e do goleiro.
O jogo 3
Na partida disputada entre terça e quarta-feira,
iniciada às 23h de Brasília e com término
por volta de 3h05, os Red Wings despertaram alegria e raiva na
torcida. Raiva após dois péssimos períodos
em que perdiam por 3-1 sem sequer conseguir chutar ao gol com
perigo. Alegria depois de buscar o empate faltando 8 minutos para
o fim do jogo.
Dominando do terceiro período em diante os Wings massacraram
da forma como um time superior e mais experiente deveria fazer
desde o primeiro minuto de jogo. O empate veio em 28 segundos
entre os gols de Zetterberg e Mathieu Schneider. Com o momentum
a favor, o time tentou, em vão, definir a partida, o que
não aconteceu.
Prorrogação pela segunda vez na série. E
Jason Williams marcou o gol da virada histórica dos Red
Wings! A equipe invadiu o gelo para comemorar. Mas espere... o
disco passou pelo lado de fora da rede e o gol foi anulado. Mais
uma mensagem clara da indisposição dos deuses de
hóquei para com os Wings.
Segunda prorrogação pela segunda vez na série.
E Jarret Stoll marcou o gol da vitória dos Oilers!
Liderança na série e a impressão de que os
Oilers estão muito próximos das semifinais de conferência,
principalmente porque os Wings estão muito longes de qualquer
postura que vença jogos, embora os últimos 59 minutos
do jogo 3 tenham sido animadores.
O que esperar do jogo de quinta-feira? A mesma atmosfera da último
partida, em que o Canadá inteiro parecia gritar na arena
dos Oilers. O Edmonton vai fazer a mesma coisa que fez nos três
jogos anteriores, cabendo ao Detroit encontrar uma solução
para vencer tamanha entrega e dedicação do adversário.
Com um agravante: Yzerman pode perder o jogo após sofrer
uma contusão nas costas.
Humberto Fernandes finalmente
está de férias da Universidade — por três semanas.
O HOMEM Mike
Babcock fala com os jogadores nos minutos finais do segundo
jogo. Ele, que esteve à frente do Anaheim que varreu
o Detroit em 2003, não encontra uma solução
para derrotar o trap.
(Carlos Osorio/AP - 23/04/2006)
NA MEMÓRIA
Os Red Wings comemoram o gol de empate de Schneider
no jogo 3. Mas quem vibrou no final foi a torcida de Edmonton.
(John Ulan/CP - 25/04/2006)