Por: Eduardo Costa

Evgeni Nabokov passou por um longo período de hibernação, onde suas principais habilidades praticamente desapareceram do mapa da NHL. A má fase, que minou as estatísticas do goleiro na temporada 2005-06, coincidiu com a ascensão meteórica do finlandês Vesa Toskala. Com isso Nabokov deixou de ser o dono absoluto da meta do San Jose Sharks.

Nos quatro primeiros meses da atual temporada, o treinador Ron Wilson revezou seus dois goleiros principais. Isso durou até 14 de fevereiro. Com Toskala no departamento médico — virilha — temos visto aquele Nabokov de outrora. Excelente posicionamento entre as traves, concentração e regularidade. Características que há muito colocaram Nabokov entre os melhores em sua posição em toda a liga. Características que voltaram a ser vistas, especialmente nos últimos cinco jogos. Mas antes de falar sobre esse aparente renascimento, gostaria de endereçar as próximas linhas ao povo do Cazaquistão, portanto, se você não é cazaqui, por favor pule os próximos cinco parágrafos.

Qualquer leitor que acompanha essa publicação há algum tempo já sabe que somos grandiosos no Cazaquistão. Talvez seja pelo nosso respeito imutável pela seleção cazaqui, ou até mesmo pelo nossa admiração pela flecha das estepes, Alexander Perezhogin, atacante do Montreal Canadiens. O que sabemos ao certo, é que nosso editor-chefe Alexandre Giesbrecht sequer consegue andar pelas ruas da capital Astana, tamanha a quantidade de fãs ávidos por autógrafos, e o segundo nome de nossa hierarquia redatorial, Marcelo Constantino, já virou nome de praça em uma pequena aldeia mongol no singelo interior desse pacto país.

Devido a esse status que alcançamos no país asiático, temos que tomar muito cuidado quando falamos sobre o goleiro dos Sharks, Evgeni Nabokov, que é tão cazaqui quanto as maiores alcatéias do globo terrestre.

Quando venceu o Troféu Calder de melhor novato em 2001, Nabokov fez toda uma nação se orgulhar. Ver um de seus filhos se consagrando na maior liga de hóquei do globo fez com que vários garotos acreditassem que o sonho de chegar à NHL era possível. O goleiro seguiu mantendo o bom nível e foi estabelecendo marcas recordes na franquia californiana. Logo camisas do San Jose Sharks se tornaram os itens mais desejados entre todas as classes sociais cazaquis. Até que tudo apodreceu.

Nabokov se achou grande demais para a humilde seleção do Cazaquistão. Ele fez de tudo para defender a seleção russa. Ao contrário do lendário Arturs Irbe, que optou por defender sua singela Letônia, Nabokov virou as costas para os que mais torceram por ele. O ponto alto da perfídia se deu nos Jogos Olímpicos de Turim, no ano passado. No dia 18 de fevereiro, Cazaquistão e Rússia se enfrentaram na fase de grupos. Na meta cazaqui estava Vitali Yeremeyev, natural de Ust-Kamenogorsk. Mesma cidade onde nasceu Nabokov, que, na mesmíssima noite, estava no gol contrário, defendendo as cores russas.

Impossível imaginar a dor de milhões de pessoas em território cazaqui. Ainda mais porque a partida terminou com um 1-0 favorável a Rússia. Nabokov não facilitou e isso jamais será esquecido. Existe um lugar no inferno reservado para quem trai a grande nação do Cazaquistão! Por isso gostaria de dizer que, apesar de estar elogiando a fase atual de Nabokov, me solidarizo com nossos mais fiéis leitores, os cazaquis. Se falo bem sobre Nabokov, é por livre e espontânea pressão. Estava na pauta da semana.

Nas últimas cinco partidas, foram três shutouts, quatro vitórias e apenas três gols sofridos. Começando contra um rival de divisão do pacífico, o Dallas Stars, no dia 4 de março. Um total de 26 defesas pode não parecer muito, mas foi a qualidade delas que fez com que todos os entrevistados dos Sharks citassem a atuação de Nabokov, após o embate vencido por 4-0. Uma foto de uma defesas difíceis ilustra essa coluna ao lado.

Duas noites depois, outras 26 defesas, outro shutout. Em St. Paul, contra o Wild, o time deu um show de disciplina, não cometendo uma mísera penalidade. Quando o jogo ainda estava empatado, Nabokov levou a melhor contra Todd White e Brian Rolston. Ron Wilson fez questão de dizer que foram defesas fundamentais, já que virar o placar contra uma equipe dirigida por Jacques Lemaire, ainda mais diante da sempre participativa torcida de Minnesota, é sempre uma tarefa indigesta. Os Sharks não precisaram lidar com essa adversidade.

Após os dois prélios citados acima, tivemos o duelo entre Evgeni Nabokov e Roberto Luongo em San Jose. Foi um jogo com cara de pós-temporada e ambos os goleiros não defraudaram. O gol de Taylor Pyatt, no início do terceiro período, encerrou a seqüência de mais de oito períodos sem levar gol de Nabokov. Foram 166 minutos e sete segundos sem ser batido, 19 minutos a mais de invencibilidade que a anterior melhor marca histórica da franquia — a antiga também pertencia a Evgeni. Infelizmente, para os torcedores locais, as 35 defesas do cazaqui não foram suficientes para evitar a derrota por 2-1.

Atualmente nada é melhor, ainda mais após uma derrota, do que enfrentar o Edmonton Oilers. Nabokov e seus companheiros não tiveram problemas para vencer o time da província de Alberta por 3-0 em casa. A coisa poderia ser mais fácil se Petr Nedved não tivesse fora do elenco petroleiro por contusão. Muita gente fala da saída de Ryan Smyth como principal motivo da queda dos Oilers na tabela, mas o fator Nedved não deve ser descartado. O cara é tão comprometido com a vitória e com a raça quanto um funil, além de ser um dos maiores pé-frios da história do hóquei. Mais quatro Petr Nedveds e o problema do aquecimento global seria coisa do passado.

Depois do trâmite contra os Oilers viria o Chicago Blackhawks, que buscava sua quarta vitória consecutiva. Foi o jogo em que o principal reforço adquirido pelos Sharks no dia limite de trocas desencantou: Bill Guerin marcou seus primeiros três gols pelo time. Nabokov, em seu 13.º jogo consecutivo como titular, tinha seu quarto shutout em cinco jogos quase nas mãos, quando, com pouco mais de três minutos restando para o final da peleja, Martin Lapointe fez o gol de honra. O 7-1 final recoloca os Sharks na briga pelo título da divisão. Já Nabokov volta a freqüentar lugares de destaques em diversos quesitos, como em shutouts, onde suas sete unidades o colocam em uma solitária segunda posição, apenas atrás do mito inoxidável Martin Brodeur. Com essas recentes atuações, acho difícil, mesmo com Toskala já apto a atuar, que o rodízio na meta dos tubarões seja mantido.

No guia da temporada, coloquei os Sharks como meu favorito à conquista da Copa Stanley, e eu nem contava com a possibilidade de ver Nabokov reeditar aquelas atuações inspiradas e freqüentes que o fizeram figurar entre os melhores goleiros do mundo há algumas temporadas. Se ele mantiver esse ritmo, acho que esse prognóstico, vindo de um obscuro colunista de hóquei, pode se tornar ainda mais plausível. E quem sabe não seja uma oportunidade para Evgeni se reconciliar com seus antigos camaradas, levando a Copa Stanley para uma visita ao glorioso Cazaquistão.

Eduardo Costa está animado com o início das pós-temporadas das ligas européias.
Ronald Martinez/Getty Images
Nabokov pode ser considerado um traidor no Cazaquistão, onde somos estrelas consagradas, mas sua ótima fase não poderia ser ignorada pela TheSlot.com.br.
Paul Battaglia/AP
Outro shutout, dessa vez contra o Wild em St. Paul. Evgeni vem do país que abriga a maior população de lobos do planeta. O que isso tem a ver com a foto? Também não sei.
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Página publicada em 14 de março de 2007.