Por: Jacy Borreaux

Um homem e sua missão! Mais uma vez viajo rumo ao desconhecido e ao desagradável. Meu destino agora é East Rutherford, pequena cidade do estado de Nova Jérsei que hospeda os Devils, uma insossa, porém vitoriosa, franquia da Liga Nacional de Hóquei.

E não vou mentir. Definitivamente eu não queria vir para Nova Jérsei, mas não tive escolha, afinal, a TheSlot.com.br tem um compromisso com seus leitores, um compromisso permanente com a busca da verdade. Mas quando essa verdade está em um lugar cheio de brejos e com rádios que a cada dois minutos executam a medonha "It's My Life” do Bon Jovi, eles mandam algum infeliz, no caso eu, buscá-la.

Pra quem não sabe, Bon Jovi ama Nova Jérsei e Nova Jérsei ama Bon Jovi. Justificável, afinal o cantor é um dos principais nomes da fauna e flora local. Pena que esse amor recíproco entre o transvestido músico e os nativos não exista entre o New Jersey Devils e o estado de Nova Jérsei. Três Copas Stanley conquistadas em quatro finais desde 1995 poderia resultar em uma base sólida e numerosa de adeptos, mas isso é uma quimera, uma utopia, uma fantasia.

Continental Airlines Arena cheia em jogos dos Devils? Só quando os Rangers ou os Flyers atuam por aqui. Aliás, a grande presença de torcedores desses dois times nos confrontos contra os Devils em East Rutherford servem como uma direita no queixo dos seguidores do time de Jérsei, que gostam de citar a péssima localização da atual arena da equipe como principal motivo da fraca presença de público. Ora, se muitos saem de suas casas na Filadélfia e em Nova Iorque para acompanhar suas respectivas equipes em Meadowlands, por que seus similares endiabrados não poderiam fazer o mesmo?

Está certo que, historicamente, o estilo de jogo da franquia não é dos mais agradáveis, o que fez com que esse time fosse tido como o símbolo maior da era do disco morto. Uma época em que defesas predominaram, e onde a velocidade e fluidez praticamente desapareceram dos rinques da NHL. Mas, apesar dos meios, vencer é sempre divertido, e os Devils estão sempre nas cabeças. E, com a proliferação das farmácias, basta, antes de encarar um jogo dos comandados de Claude Julien, adquirir uma cartela de antidepressivos — drogas mágicas que aumentam o tônus psíquico, melhorando o humor e, conseqüentemente, melhorando a psicomotricidade de maneira global. Então uma generosa quantidade de Prozac pode fazer com que uma partida dos Devils dobre sua emoção real, ficando tão divertido quanto ler o livro "Mil e uma maneiras de como beber um copo d’água".

Como se não bastasse a ignomínia de não conseguir encher sua arena até mesmo em alguns jogos de pós-temporada, o conceituado jornal The New York Times publicou que um recente confronto entre os Panthers e os Devils na Flórida, transmitido pela MSG Network para a região de Nova Iorque/Nova Jérsei — o maior mercado televisivo ianque — teve um mísero total de 736 lares sintonizados no embate. Isso mesmo, 736! Isso é menos do que a TheSlot.com.br teve de acessos com minha coluna sobre os 40 anos sem Copa Stanley do Toronto Maple Leafs!

Na mesma noite de Panthers-Devils, uma partida de lacrosse, um esporte bizarro e pouco conhecido, entre o New York Titans e o Rochester Nighthawks, atraiu a atenção de 10.271 lares da grande maçã e adjacências. Ah, e o público da partida na Flórida foi de 18.136. Os Panthers estão em situação complicada em sua conferência, já os Devils brigam pelos primeiros postos no mesmo Leste. Enquanto quase 19 mil foram assistir os mamíferos felídeos, os Devils, em muitas oportunidades, sequer chegam à casa dos dez mil, como contra os Canadiens em NJ, há exato um mês, quando apenas 7.515 pessoas compareceram.

Com todos esses exemplos, não há como discordar do filósofo grego Siphodemos, 2530 a.D.D. (antes de Dallas Drake), quando ele afirma em alto e bom som que a torcida dos Devils "non ecziste!"

Tradicionalmente as equipes que vencem a Copa Stanley comemoram com paradas que, na maioria das vezes, levam milhões de pessoas às ruas. Já as conquistas dos Devils são comemoradas no estacionamento do complexo esportivo de Meadowlands. E sem que o mesmo ficasse cheio com a presença maciça (?) de seus torcedores.

Após vencerem a Copa Stanley contra o Anaheim em 2003, cerca de 20 mil testemunhas foram festejar no estacionamento. Entre essas testemunhas estava um dos torcedores símbolos da franquia, o então governador do estado de Nova Jérsei, Jim McGreevey, que chegou a discursar sobre o orgulho que sentia por ser um torcedor dos Devils. Mas isso não significa muito, já que McGreevey também sente orgulho de ser gay. Isso mesmo, G-A-Y! Pra quem não tem boa memória e/ou não acompanha os noticiários políticos, McGreevey ganhou notoriedade mundial ao confessar que cometia adultério (era casado e com filhos) com outro homem. Ou seja, ele fornicava com um ser do mesmo sexo! Bem, eu não tenho nada contra essa gente que joga contra o patrimônio, mas, pelo que li na bíblia, isso é uma baita transgressão ética e moral. Definitivamente eu não gostaria que ele fosse o orador de uma conquista Habitant.

Após McGreevey discursar no estacionamento, Scott Stevens, o capitão, apareceu com a Copa Stanley. Stevens era uma cara mau. Um dos melhores na nobre arte de destruir os oponentes com devastadores trancos no meio do gelo. Stevens sempre foi muito corajoso, e cada longa viagem dos Devils em pós-temporada teve a marca do defensor. E ele sempre escolhia oponentes igualmente maus, asquerosos e brigões. Exemplos? Gente como Slava Kozlov, Ron Francis, Tomas Kaberle, Shane Willis, Sami Kapanen e Paul Kariya. Valente esse Stevens!

Ok, ele também detonou Eric Lindros, mas isso depois de Lindros ter sido vitimado pelo fúria caótica de Darius Kasparaitis. Após ter sido abatido pelo lituano, Lindros nunca foi o mesmo. O que Stevens bateu realmente foi no que sobrou de Lindros.

Bem, todo esse papo foi só para encher lingüiça, já que estou há horas no saguão de desembarque do aeroporto de Newark — a maior cidade do estado — esperando uma condução para East Rutherford. Falando em Newark, uma nova arena está sendo construída aqui, e já para a próxima temporada os Devils terão à disposição o Prudential Center, uma moderna arena para 18 mil pessoas. Ou seja, os Diabos vão sair de uma cidade com menos de dez mil habitantes (East Rutherford), para uma com cerca de 280 mil. Isso poderia significar que muito em breve Martin Brodeur poderia ter cinco ou até mesmo seis torcedores a mais para vê-lo quebrando o recorde histórico de shutouts que pertence a Terry Sawchuk. Mas essa arena nova vai significar também ingressos mais caros. Com isso, talvez quatro desses cinco torcedores desistam da idéia.

Após muito esperar entrei no ônibus que faz a linha Newark-East Rutherford. O caminho é bem pitoresco, vi muitos pântanos e insetos do tamanho de capivaras. No trajeto pude ver que o time mais popular aqui na região é o New York Jets, da NFL. De hóquei vi pouca parafernália. Inclusive um sub-anormal usando uma camisa do Columbus Blue Jackets!

Já em East Rutherford, aproveitei a tarde livre e fui caminhar. A única pessoa que vi usando algo — um boné — dos Devils foi Robles Garcia, que trabalha como encanador em East Rutherford há dois anos. Puxei assunto e descobri que o señor Garcia sequer sabe quem são os Devils. Segundo ele, um primo virou evangélico e deixou de usar o boné por causa da cauda e do chifre no logo do time. Robles Garcia então aceitou o mesmo como doação.

Perambulei por mais duas horas, mas a cidade é realmente muito insossa. A intenção dessa coluna era, assim como foi feito em Toronto, mostrar como os locais sentem e vivem o hóquei. Mas aqui em East Rutherford isso é impossível. Sinto que a essência de minha viagem foi para o ralo. Desculpem-me.

Diante do fracasso iminente dessa etapa de minha saga, resolvi ir para o hotel, descansar e responder a alguns e-mails de meus leitores (?).

Segundo a sempre bem informada alta cúpula Sloteana, os Devils enfrentariam os Penguins no anoitecer de terça-feira. Ao contrário de Toronto, onde conseguir um ingresso em cima da hora para ver os Maple Leafs atuarem é uma tarefa quase impossível, fiquei tranqüilo em relação aos Devils. Ingressos sobram! A única coisa que preparei com antecedência foi meu kit de sobrevivência: repelente, protetor auditivo, uma cartela de Nefazodona e um frasco de Psiquial.

Quase 9h30 da noite saí do hotel rumo à arena. Meus amigos, quase tive um enfarte quando me aproximava da Continental Arena. Nunca vi tanta gente na vida! Milhares de questões passaram a rondar meu consciente. Estaria eu e quase toda a imprensa escrita e falada mentindo para nosso público? Estaríamos vendendo a falsa idéia de que os torcedores dos Devils são poucos e infiéis? Estaria eu louco para acabar logo essa coluna para poder assistir ao último episódio de Prison Break?

E o mais impressionante, havia um mar de bandeiras colombianas! Logo pensei em Scott Gomez, cuja mãe é de origem colombiana. Incrível, nunca pensei que tantos latinos pudessem gostar da NHL. Diante desse cenário, vi que seria impossível conseguir um ingresso para o jogo. Então fiz o que qualquer pessoa razoável e de bem faria: esperei algum idoso dar mole com um ingresso na mão e, com o auxílio de um pedregulho, "adquiri" meu tíquete para ver Devils e Penguins.

Mas, sei lá, algo de estranho havia na atmosfera. Isso ficou ainda mais latente quando tentei puxar assunto com um jovem que estava à minha frente na fila. Quando perguntei sobre o que ele esperava de Gomez, ele me respondeu: " ¡Ah si, Gomez! El pendejo se quedo en Cartagena con mi madre. El muy boludo se borra en los aviones..."

Não entendi nada, mas vida que segue.

Assim que entrei na Continental Airlines Arena notei que não havia espaço para mais uma única alma no recinto. Aí veio o golpe de misericórdia. Lembram quando eu disse que a sempre bem informada redação da TheSlot.com.br me disse que o jogo contra os Pens seria nessa terça-feira? Pois bem, às 22h30 o sistema de som da arena anunciou, para delírio dos colombianos, que em meia hora começaria mais um show da turnê mundial de Shakira!

Depois fiquei sabendo que só na noite seguinte os Penguins estariam na cidade para enfrentar os Devils. Pensei em reclamar com os responsáveis pela confusão, mas, pensando bem, entre Shakira e o New Jersey Devils...

Fala que eu te escuto!
Eu, Jacy Borreaux, recebi e-mails. Sim, também não acreditei quando fiquei sabendo. Eu sequer sabia que tinha leitores!

Um dos e-mails veio de Stella Ermetice. Arquiteta, campineira e torcedora do Tampa Bay Lightning, ela é um dos integrantes do portal nhlbr.com.br — onde trabalha meu amigo Ticiano Sangalli, que nunca viu seu time ser campeão da Copa Stanley, já que torce pelo Toronto Maple Leafs! Bem, antes de tudo parabenizo a Srta. Stella por conseguir conciliar seus intensos afazeres domésticos (passar, lavar, limpar, cozinhar, etc.) com o de colunista e arquiteta — eu mal consigo ler jornal e comer uma esfiha ao mesmo tempo. E também agradeço pelas palavras de apoio que me mandou. De coração, muito obrigado.

E quem quiser enviar elogios, sugestões e doações (de bacon a euros), meu endereço eletrônico é jacy_borreaux_slot [arroba] yahoo [ponto] com, ou então mande para a central de relacionamento Sloteana, escrevendo "Fala que eu te escuto" no topo da mensagem. Agora, se você quiser enviar críticas, palavrões e ameaças, mande para qualquer outro inepto da TheSlot.com.br.

Jacy Borreaux é fã de Lord Tsoukality, o grego, e de Humberto Fernandes, o ícone.
Arquivo pessoal de Marco A. Lopes
Como se não bastasse a armadilha da zona neutra, o ex-governador frescão Jim McGreevey e Ken Daneyko, Nova Jérsei ainda tem como símbolo o cantor (?) Bon Jovi, aqui em seu momento mais másculo (?). Está parecendo minha tia Anne-Marie Borreaux!
Crédito: Zé Ferreira, Ceará
Típica paisagem de East Rutherford. Em breve o time abandonará os pântanos e uma gama considerável de animais peçonhentos de East Rutherford, para atuar na novíssima Prudential Center, em Newark. Espera-se um aumento de dois a seis torcedores com essa mudança.
Arquivo TheSlot.com.br
Horrendo e perverso, o demônio de Jérsei aterrorizava pobres crianças indefesas desde o século XVIII. Hoje essa função pertence ao gerente geral Lou Lamoriello, que está na organização desde 1987.
Crédito: Zé Ferreira, Ceará
Mais um jogo de casa cheia para os Devils. O time costuma comemorar suas conquistas no estacionamento do complexo esportivo de Meadowlands. Mas se você precisar de uma vaga para estacionar seu bólido, não se preocupe, tem espaço de sobra.
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Página publicada em 14 de março de 2007.