Por: Thiago Leal

Clássico de Inverno repercurte até na mídia brasileira, para o bem ou para o mal.

Eu esperava que o tal AMP Energy NHL Winter Classic, ou Clássico de Inverno para os mais ufanistas, fizesse sucesso e repercurtisse bem. Mas não esperei que fosse para tanto! Ora essa... hóquei no Globo Esporte? Isso é o que eu chamo de "globalização" (ou "Globolização")! É uma pena que, no geral, este "apoio" da mídia fez mais mal que bem ao esporte mais rápido no gelo e à sua já arranhada imagem junto à opinião pública brasileira.

Claro que essa pequena divulgação, que teve outros canais, como o portal de esportes do Terra.com.br, é motivada baseicamente pelo fato do Clássico de Inverno ter sido realizado ao ar livre, o que se torna aos olhos do jornalismo esportivo brasileiro uma "excentricidade". Mas o minidestaque, que devia ser algo benéfico ao esporte, passa a ser maléfico quando, nas entrelinhas ou mesmo de forma descarada, o hóquei é vendido como um pequeno show de horrores e pancadaria.

Fazendo um apanhado geral da cobertura do Clássico de Inverno pela mídia brasileira, o que se encontra é de praxe: muita desinformação, notícias pela metade e um mero caráter de "curiosidade", não de reportagem. O site do Bom Dia Brasil, por exemplo, noticiário da Rede Globo, resumiu a partida em alguns parágrafos, dizendo apenas o nome dos dois times que jogaram, o placar final e... elogiando o público que "enfrentou o frio e uma nevasca" para assistir ao jogo. O Terra.com.br, que também não fez um texto lá dos melhores, deu-se ao trabalho de disponibilizar algumas fotos da partida, levantou curiosidades como público presente, informou o nome do Ralph Wilsom Stadium explicando que é, originalmente, voltado ao Buffalo Bills... mas também não deu uma linha a Colby Armstrong ou a Sidney Crosby, os destaques do jogo. Seria como descrever uma vitória do Milan sem citar Kaká ou Andrea Pirlo, fazendo um pequeno paralelo futebolístico. Ah, sim, e a notícia inicialmente trazia a errônea informação de que este seria o primeiro jogo a céu aberto da liga, e foi devidamente corrigida em seguida.

Esse mesmo equívoco foi cometido e não corrigido no site de mais um programa global: o Globo Esporte. Duas pequenas notas acompanhadas de fotos informando que aquele seria "o primeiro jogo a céu aberto da NHL". É incrível como um pequeno "furo jornalístico" a distância consegue ser mal-divulgado. Pergunto-me se seria preguiça de adquirir e passar a informação correta — bastava ler duas linhas do Yahoo.com ou do ESPN.com para saber o que falar acerca do Clássico de Inverno, ou AMP Energy NHL Winter Classic, nome oficial do evento que não foi divulgado em nossos veículos de comunicação.

E o UOL, talvez o principal portal de notícias brasileiro, limitou-se a copiar o texto do Terra.com.br na hora de noticiar um evento de certa forma importante.

Se compararmos tudo isso com os meros 30 segundos televisivos que a TV portuguesa RTP voltou ao jogo no seu noticiário RTP News, temos muito mais informação de forma mais direta e correta — informando local do jogo, número de torcedores, clubes, placar, a ocasião em que se deram os 2-1, que foi na disputa de pênaltis... e, lógico, explicando que o evento foi o segundo, não o primeiro da história da Liga.

Talvez seja injusto cobrar isso da mídia brasileira. Por um lado. Porque, por outro lado, a mídia esportiva brasileira informa de tudo. Mesmo esportes não populares e não praticados no Brasil, como o curling e o críquete, que na época de seus torneios mundiais tiveram notícias razoáveis em portais como UOL e canais como ESPN Brasil.

De todos, porém, o Globo Esporte televisivo foi o que chegou mais longe na hora de "analisar" a partida. Depois de exibir os gols e a vitória do Pittsburgh Penguins, o que se viu na tela da Globo foi uma coletânea de trancos. Uma série deles. E tudo isso tinha como fundo a narração da âncora Glenda Kozlowski, que declarava que "infelizmente" o esporte permitia esse tipo de jogada. É aí que a Rede Globo vai longe demais na hora de opinar sobre um esporte.

O mesmo foi feito durante os Jogos Olímpicos de Inverno Turim 2006, mais ou menos dois anos atrás. O Jornal Nacional, que "cobria" o evento, anunciou a estréia do hóquei no gelo e exibiu uma mesma coletânea de trancos, criticando indiretamente a forma de se jogar esse esporte estranho aos olhos brasileiros. Houve até uma curtíssima entrevista com Vincent Lecavalier, que tentou, de forma educada, defender o esporte. Kozlowski foi infeliz na declaração por não explicar que o hóquei no gelo é um esporte de impacto, e o "tranco" (ou o tal "tipo de jogada", como ela se referiu) faz parte do jogo sem (necessariamente) agredir o fair play. Ora... imagina se pegam um jogo onde acontece uma briga daquelas. O que seria da imagem no hóquei no gelo no Brasil?

O fã de hóquei sabe que esse tipo de matéria acaba "queimando" sua imagem, a partir do momento em que parentes e amigos que assistem ao noticiário imediatamente o metralham com "Como você consegue gostar dessa pancadaria?". Assemelha-se ao que fez a mesma Globo, através do Jornal Nacional, no dia do "rock pesado" no Rock In Rio 2001, que era a tarde/noite em que teríamos Sepultura, Rob Halford e Iron Maiden. O noticiário pegou uma roda de pogo do público e a soltou na tela, meio que recriminando a atitude, embora tenha tentado dar um tom de curiosidade.

O apanhado geral do que foi divulgado no Brasil é o mesmo de sempre. O mesmo de tudo que se relatou no número 19 de TheSlot.com.br, o mesmo que se comenta em listas de discussão, em comunidades do Orkut e afins: o hóquei nunca é divulgado no Brasil; quando é divulgado, vem cheio de informações equivocadas e ainda por cima ganha uma tachação de pancadaria. Sequer param para pensar que trata-se do esporte popular de um dos países mais desenvolvidos e civilizados do mundo, o Canadá. Sequer param para pensar que nosso esporte popular, o futebol, nem ao menos é um esporte de impacto como o hóquei e só em jogadas como carrinhos, cotoveladas e "entradas mais duras" consegue reproduzir tanta violência quanto. E o vilão ainda fica lá em cima, debaixo de uma tempestade de gelo...

Thiago Leal não assiste à Rede Globo e preocupou-se em assistir à matéria do Globo Esporte pela Internet quando ficou sabendo que a mesma teria sido equivocada e injusta com o melhor esporte do mundo.
CP Photo/Adrian Wyld
O famoso Heritage Classic, ao ar livre, em 2003. Para parte da mídia brasileira, este jogo não aconteceu.
Harry How/Getty Images
Para a infelicidade de Glenda Kozlowski, Jaroslav Spacek acerta um tranco em Jordan Staal, e isso é permitido.
Dave Sandford/Getty Images
Sidney "Menino" Crosby, o "Lionel Messi dos Penguins", foi o nome do jogo. Mas nem foi lembrado pela mídia brasileira...
Harry How/Getty Images
Afinal de contas, faz muito mais sentido dar os méritos a um bando de torcedores anônimos só porque saíram de casa numa tarde de inverno.
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Página publicada em 9 de janeiro de 2008.