Por: Alexandre Giesbrecht

Eu gostaria de falar aqui sobre os Ducks. Mas não consigo. Como lembrou o colega Thiago Leal, notório torcedor do time de Anaheim: "O foco tem de ser o fracasso dos Sharks. Se eles fossem eliminados pelos Jackets, seria a mesma coisa. Os Ducks nesta história são meros coadjuvantes." Talvez coadjuvantes seja um exagero, mas é inegável que o protagonista é o San Jose, a esta altura no mesmo lugar que o navio de O Destino do Poseidon.

O protagonista é composto por uma série de subprotagonistas. É difícil até listá-los em alguma ordem. O primeiro a ser lembrado, desde quando ainda tinham os Sharks alguma chance, foi Joe Thornton. Aliás, por seu papel como Homem-Invisível, ele mereceria até uma indicação ao Oscar. Quando tentou encarnar um personagem mais, digamos visível, como na briga com Ryan Getzlaf, sua atuação foi medíocre. Não só porque foi necessário que Getzlaf desse início ao ritual, mas porque a vitória de Thornton na briga não gerou nada mais que três penalidades posteriores cometidas pelo Anaheim, das quais duas foram desperdiçadas e uma levou a um gol dos Sharks que foi neutralizado dois minutos depois. Após a eliminação, fez como estrelas do cinema em viagem ao Brasil e saiu sem dar entrevistas, assim como já havia feito após o jogo 4.

Quem também sumiu — como alguém pode ser protagonista, ou até mesmo subprotagonista sumindo? Não interessa; a metáfora ainda cabe — foi o desvanecente de Aneroid, Saskatchewan, também conhecido como Patrick Marleau. Depois do fatídico jogo 6, ele deu uma declaração que faz crer que usará a desculpa de estar machucado durante a série: "Vou dar alguns dias antes de informar a vocês." Até faria sentido para quem o viu no gelo (não muitos, se pararmos para pensar). O problema é que a função de informar a respeito de contusões geralmente fica a cargo do gerente geral Doug Wilson. O futuro do capitão em San Jose já começa a ser questionado.

Um vilão recorrente, que só não podemos chamar de antagonista pis neste enredo só há vilões, é Evgeni Nabokov. Desta vez, seu nome será citado com menos frequência, porque ao menos nas duas vitórias dos Sharks ele teve seus momentos de brilhantismo demonstrados com defesas importantes. O problema é que suas atuações nas quatro derrotas foram apenas medíocres. No jogo da eliminação, três dos quatro gols que ele sofreu foram no mínimo questionáveis. Àquela altura uma atuação digna de... hum... Jonas Hiller já não teria sido suficiente, porque, à exceção daqueles primeiros minutos do jogo, los Tiburones já estavam com um belo anzol na boca, e os pescadores vestidos de negro estavam prontos para puxá-lo.

Tudo bem que os Ducks de 2008-09 são um belo exemplo de um time que ficou em oitavo na conferência por acaso. Mas, ao contrário da maioria dos outros exemplos que se possa imaginar, era para eles estarem acima dessa posição, não abaixo. Uma temporada altamente irregular é o motivo de eles terem ficado atrás dos Blue Jackets, e um golpe de sorte dos Blues fez com que no último dia os Ducks deixassem de pegar os Red Wings e marcassem seu encontro com os Sharks. Parêntese: torcida dos Sharks, se querem um culpado para a eliminação do time, que tal procurá-lo em St. Louis? Fim do parêntese.

Estas considerações postas, seria difícil imaginar que os Ducks fossem ter tanta facilidade pela frente contra uma equipe que ganhou mais pontos que qualquer outro ao longo de 82 jogos. Isso só foi possível graças à fantástica atuação do goleiro Hiller, que certamente deixou os 2,3 mil habitantes de Felben-Wellhausen orgulhosos, anulando o sétimo melhor ataque da liga, incluindo aí shutouts no primeiro e no quarto jogos. Logo ele, que tem um sobrenome suficientemente parecido para dar calafrios à torcida dos Pens. E logo em cima dos Sharks, um time cujas primeiras memórias nos playoffs foram surpreendentes vitórias em sétimos jogos como oitavos colocados em 1993-94 (contra os Red Wings, melhor campanha do Oeste) e como sétimos no ano seguinte (contra os Flames). Isso é que é carma!

Os Ducks, que já têm experiência em surpresas de primeira rodada, seguem em frente, com mais uma pedreira: o Detroit, mesma primeira vítima de 2002-03. Dá para ganhar? Dá. Vão ganhar? Duvido. Apesar de terem ficado atrás dos Sharks na temporada regular, os Wings são inegavelmente mais time. Dê aos Wings uma atuação como a dos Ducks no jogo 5 (classificada pelo próprio técnico Randy Carlyle como "morte cerebral"), e os vermelhinhos vão fazer a festa. Hiller certamente não vai ter pela frente um ataque que às vezes está a fim de jogar. Ele não vai precisar só de uma atuação como na primeira fase; ele vai precisar ser uma muralha à Giguere de 2003. O histórico ordinário dele na temporada regular demonstra que isso está longe de ser uma garantia.

Hiller, entretanto, está longe de ser a única chave da série que se avizinha. No outro gol, os Wings contarão com o sempre questionado Chris Osgood, que teve uma boa campanha nos playoffs do ano passado, mas não foi nem um pouco insubstituível. Como os 18 gols dos ex-Mighty Ducks foram muito bem distribuídos entre 11 jogadores, dá para contar que, mesmo se a linha de Getzlaf for contida, o ataque funcionará de alguma maneira, especialmente se a defesa do Detroit tiver lapsos tão constantes quanto no jogo 4 contra os Jackets, o que não ocorreu nos três jogos anteriores.

No fim das contas, temos uma série bastante interessante pela frente, mesmo que os Wings sejam favoritíssimos. Caso os Sharks tivessem passado, agora só se falaria de como as semifinais do Oeste representariam apenas um vestíbulo para o que supostamente interessaria de verdade, um confronto entre Sharks e Wings que já não é mais possível. O mar do Oeste abriu-se diante do Detroit, que enfrentam agora o peso de uma responsabilidade que não têm há muito tempo. Os Ducks são a primeira legião atrás dele. Ela ou alguma das outras será capaz de pará-lo?


Eu espero que não seja uma tática, porque, se os Hurricanes esperam ganhar dos Bruins contando com gols no último minutos, como o da semana passada e os do jogo 7 contra os Devils, a coisa vai ficar feia. O Boston já demonstrou na primeira fase que consegue chegar ao último minuto com vantagens bem confortáveis.


Como se não bastasse a rivalidade crescente entre Alexander Ovechkin e Sidney Crosby, Capitals e Penguins têm um longo histórico de encontros nos playoffs. O domínio do Pittsburgh é amplo, com seis vitórias e uma derrota, mas, apesar do que os jornalistas norte-americanos querem nos fazer crer, não vai influir em nada. O único jogador de ambos os elencos que disputou qualquer daquelas séries é Sergei Gonchar, que o fez pelos Capitals e hoje defende os Pens. Mas, para as torcidas, são momentos inesquecíveis, no bom e no mau sentidos.

Ninguém em Washington esquece de como os Caps eliminaram os favoritos Penguins em 1993-94 logo na primeira fase, como sétimos do Leste. Os Pens, campeões da Divisão Noroeste, perderam em seis jogos, e mesmo suas duas vitórias não foram lá muito convincentes. A torcida só lamenta que o time de Peter Bondra tenha usado todo o seu gás na primeira fase, sendo eliminado com facilidade logo em seguida pelos Rangers, campeões do Troféu dos Presidentes e a caminho de sua primeira Copa Stanley em 54 anos.

Por outro lado, a torcida de Pittsburgh tem várias histórias para contar dos confrontos com os Capitals: as duas viradas depois de estar perdendo séries por 3-1, a virada depois de perder os dois primeiros jogos em casa em 1995-96, a vitória depois de quatro prorrogações no mesmo ano, o mando de gelo invertido em 1999-2000 que praticamente garantiu a vitória na série, as constantes invasões da capital americana por torcedores da cidade do aço...

Ainda que nada disso entre no gelo, é fácil prever que uma das duas torcidas terá novas histórias para se gabar agora que finalmente a rivalidade que se resumia aos jogadores durante quatro jogos de temporada foi estendida para os playoffs. Se não sair sangue, vai ser uma série excelente. E, com sangue ou sem sangue, muito provavelmente será uma série histórica para as duas equipes.

Alexandre Giesbrecht, 33 anos, atualizou bastante a página sobre a temporada atual na Wikipédia.
Reprodução
O disco já tinha violado a linha de gol, e o cronômetro ainda marcava 0,3 segundo.
(21/04/2009)
Edição Atual | Edições anteriores | Sobre TheSlot.com.br | Comunidade no Orkut | Contato
© 2002-09 TheSlot.com.br. Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução do conteúdo escrito, desde que citados autor e fonte.
Página publicada em 29 de abril de 2009.