O texto abaixo foi publicado originalmente em 11 de maio de 2001 no jornal Pittsburgh Post-Gazette. Eu o tinha traduzido à época, com a intenção de usar no meu hoje desatualizado site sobre os Penguins, mas ele acabou ficando perdido no meu HD. Com o artigo de Eduardo Costa e a capa da edição, acho que chegou a hora de desenterrá-lo.
Darius Kasparaitis, dos Penguins, é um dos caras mais odiados
na NHL. Um cara que joga com raça e sujeira. Um cara cujo jogo
é baseado na agressividade, não no talento. E um cara
que, de vez em quando, faz alguma coisa para deixar uma marca indelével
na história do time.
Como marcar um gol aos 13:01 da prorrogação, que deu aos
Penguins a vitória por 3-2 contra o Buffalo no Jogo 7 da série
de segunda fase jogado na HSBC Arena em 10 de maio de 2001. Os Devils
vão enfrentar um time cujo elenco inclui alguns dos mais temidos
jogadores ofensivos do hóquei.
No entanto, independentemente do tamanho da lista, não é
provável que Kasparaitis apareça nela. Ele tem 19 gols
em 568 jogos de temporada regular e dois em 56 nos playoffs. Ao elaborar
as possibilidades de cada jogador de marcar um gol na prorrogação
de um Jogo 7, Kasparaitis deve aparecer apenas um pouco à frente
do goleiro reserva Jean-Sébastien Aubin.
Talvez.
"Ainda não acredito que marquei um gol", disse Kasparaitis,
cerca de 15 minutos depois do acontecimento. Não é difícil
imaginar que os 18.690 presentes aos estádio também ainda
não acreditam. Nem mesmo as pessoas no banco dos Penguins.
"Eu não vi Kaspar marcar um gol no treino, quanto mais em
um jogo", disse o ponta esquerda Kevin Stevens. "Se eu tivesse
de escolher um jogador, ele seria o menos provável a marcar".
É verdade, mas não houve nada de sorte no jeito que Kasparaitis
pôs um fim à série. Ele chegou atrasado em um contra-ataque,
recebeu um passe do central Robert Lang e mandou da esquerda do entre-círculos
um chute para dentro do gol de Dominik Hasek.
"O disco achou um espaço", disse Hasek. Kasparaitis
juntou-se ao ataque com o aval dos atacantes Jaromir Jagr, Martin Straka
e Lang, que passaram a dividir uma linha depois de o Buffalo fazer 2-1
no início do terceiro período.
"[Jagr], Marty e [Lang] disseram para eu me juntar à jogada
sempre que eu tivesse uma chance", disse Kasparaitis. "Foi
o que eu fiz. Eu tentei acompanhar a jogada e [Lang] me achou aberto.
Ele me deu o disco". "Eu iria passá-lo, mas eu disse
'tenho de chutar o disco'. Eu o chutei e o vi entrando", completou.
O gol de Kasparaitis ganhou um rodapé na história do time,
já que os Penguins tinham perdido o único outro Jogo 7
que tinha ido para a prorrogação; David Volek, do New
York Islanders, terminou com a temporada deles em 1993. Coincidentemente,
Kasparaitis era um membro daquele time dos Islanders.
Seu gol acabou com o jogo, mas a vitória pode ter sido definida
com uma decisão do técnico Ivan Hlinka, depois de uma
sugestão de Mario Lemieux, no começo do terceiro período,
depois que o Buffalo abriu 2-1 num gol de Steve Heinze em vantagem numérica.
Lemieux sugeriu colocar Jagr com Lang e Straka, subindo Alexei Kovalev
para a primeira linha, com Lemieux e Stevens.
Lang, depois de um excelente trabalho de Jagr na zona do Buffalo, marcou
o gol que forçou a prorrogação aos nove minutos
daquele período.
Os Penguins não tinham estado na frente até o gol de Kasparaitis.
J.P. Dumont abriu o placar para o Buffalo a 1:50 do segundo período,
e Andrew Ference empatou para os Penguins numa vantagem numérica,
aos 8:19.
Depois de Heinze e Lang trocarem gols no terceiro período, ficou
evidente que o gol seguinte determinaria o adversário dos Devils.
Mas até Kasparaitis vencer Hasek não dava para saber qual
time seria.
"Foi uma batalha", disse Stevens. "Você tem de
dar crédito a eles. Eles jogaram tudo o que sabiam".
Isso foi verdade particularmente para Hasek, que fez brilhantes defesas
em Lang e Ference na prorrogação, antes de falhar ao pegar
com a luva o chute de Kasparaitis.
"Hasek jogou muito bem", disse Kasparaitis. "Ele é
o melhor goleiro do mundo".
Mas não foi bom o suficiente para impedir os Penguins de ganhar
na HSBC Arena pela terceira vez em quatro tentativas na série.
Ou para impedi-los de avançar às finais de conferência
pela primeira vez desde 1996. Ou para impedir Kasparaitis de viver um
sonho que ele tinha desde que chegou à NHL.
"Eu sonhei com isso por nove anos", disse. "Isso é
o que acontece quando você acredita em si mesmo".
Os Penguins sabem tudo sobre isso. Sobre concentração
e determinação também. E sobre simplesmente recusar-se
a perder.
Afinal de contas, duas noites antes eles estavam a uma jogada ou duas
de ver sua temporada encerrada, quando Lemieux mandou o Jogo 6 para
a prorrogação ao marcar depois de o goleiro Johan Hedberg
ser substituído por um atacante extra.
"No último jogo estávamos a um minuto [na verdade,
a 78 segundos] de ser eliminados, e Mario trouxe a sua mágica",
disse Kasparaitis. "Hoje foi a minha vez".
Se alguém pensava que ele poderia fazer isso não vem ao
caso. Lemieux, que ainda não tem um ponto em prorrogações
na sua carreira em playoffs, era um herói mais provável,
mas os replays não mentem. Eles mostram Kasparaitis chegando
na jogada. Chutando o disco. Levantando seus braços. Sendo abraçado
pelos seus companheiros.
"Estávamos aqui comemorando, então isso significava
que alguém tinha marcado", disse Kasparaitis. "Os caras
começaram a me abraçar, então isso significava
que éramos nós".
Precisamente como ele marcou, bem, não importa muito. Mas a realidade
é que ele pôs um ponto final à série num
chute que qualquer um de seus colegas de time teriam orgulho de ter
dado.
"Foi um belo de um gol", disse Ference. "Não foi
um chute de sorte. Não foi golpe do destino. Foi um bonito gol.
E que jeito de fazê-lo".