Por: Eduardo Costa

Marty Turco está imóvel em sua área; ele olha fixo para o gelo e depois desvia sua mira para a outra extremidade do rinque. Na aréa de goleiro adversária está Roberto Luongo, que é cercado por seus companheiros. Eles comemoram a passagem do Vancouver Canucks para as semifinais da Conferência Oeste com a vibração que uma vitória em um jogo 7 merece. Turco permanece do mesmo jeito desde que o placar zerou. Os atletas dos Stars se aproximam e dizem palavras de conforto. Primeiro Stu Barnes, mas Turco não responde. Stephane Robidas, Steve Ott, Jon Klemm, e todos os demais, mas o semblante de Marty permanece inalterado, assim como sua mudez.

Turco sabe que, jogando bem ou mal, não existem palavras de conforto que minimizem uma derrota como essa. Mesmo que, finalmente, tenha se livrado do estigma de goleiro de temporada regular e de ter encoberto algumas cicatrizes oriundas de frustrantes e medíocres atuações em pós-temporadas passadas, a derrota é um monstro impiedoso que tudo, ou quase tudo, devora.

Antes mesmo da atual temporada começar, o grande ponto de interrogação sobre a equipe texana era se Turco novamente naufragaria nos playoffs. Que o goleiro deveria fazer uma boa temporada regular, ninguém duvidada. E foi assim que aconteceu.

O Dallas Stars teve o melhor começo de sua história com 11 vitórias em seus 13 primeiros jogos, com Turco soberbo entre as traves. Durante essa sequência de bons resultados até a minha, a sua, a nossa TheSlot.com.br sucumbiu diante do grande momento, dando capa e protagonismo em uma edição aos comandados de Dave Tippett.

Elogiamos a atitude agressiva do time, em especial quando o mesmo tentava recuperar o disco no zona adversária. Elogiamos o coeso e colaborador corpo defensivo, em especial os atletas Sergei Zubov e Philippe Boucher. A entrega de Brenden Morrow também ganhou destaque. Mas a mesma mão que escreve elogiando, que traça parágrafos de aprovações e que, durante esse tempo, abre inúmeras latinhas de Heineken, é também a mesma mão que despeja (?) palavras de alerta. Criticamos a adição de gente como Matthew Barnaby, Eric Lindros, Patrick Stefan e do nosso inimigo n.º 1, Mike Ribeiro. Bem, o tempo deu razão a essa gente ignorante que habita os corredores inóspitos dessa publicação.

Barnaby é, sempre foi e sempre será uma piada de mau gosto. Penalidades estúpidas e brigas estilo "Holliday on Ice" foram as únicas coisas que ele trouxe para Dallas. Lindros deixou de ser uma aposta de risco simplesmente porque já recebe o que faz justiça ao seu hóquei opaco, mas Dallas poderia ter trazido qualquer outra coisa ao invés dele. Bem, eu disse qualquer coisa? Eles também trouxeram qualquer coisa quando, para a alegria de boa parcela da torcida do Atlanta Thrashers, tirou Stefan da Geórgia.

O digníssimo (nem tanto) tcheco protagonizou o lance mais bizarro da temporada. Contras os Oilers, em Edmonton, conseguiu, a poucos centímetros da meta vazia, perder o gol mais feito de que se tem notícia. Brutal! Até mesmo o mais fracassado jogador da liga argelina de hóquei sobre o gelo — sim, há uma! — riu de um jogador que já custou uma primeira escolha geral.

Não satisfeitos com isso, Ribeiro chegou. Se um dia uma equipe conseguir vencer a Copa Stanley tendo Ribeiro e Stefan no elenco, o mais preciso troféu do mundo dos esportes perderá parte de sua magnificência. E por incrível que pareça, Ribeiro, com 59 pontos, foi o mais produtivo dos Stars na temporada. Obviamente o ex-Habitant atingiu esse status devido ao longo período em que Modano e Morrow ficaram de fora, vitimados por contusões. Mas, mesmo quando o time esteve saudável, o ataque era visivelmente o ponto débil do time. Até os cumpridores finlandeses Jere Lehtinen e Antti Miettinen ficaram aquém do esperado. Modano pareceu sentir a perda da capitania da equipe e não foi aquele virtuoso de sempre, embora tenha dado mostras de sua classe e velocidade.

Com isso, sobrou para os veteranos defensores, Zubov (54 pontos) e Boucher (51) produzirem. Ambos fizeram justiça aos contratos de cifras generosas que possuem.

A boa tarefa de Turco e de seus linhas azuis deixaram o time em condições de brigar pelo topo da Divisão do Pacífico até o início de abril. Se o título (?) acabou em poder do Anaheim Ducks, pelo menos a campanha de 107 pontos e 50 vitórias rendeu uma tranqüilíssima classificação à pós-temporada. E quando ela chegou, os questionamentos e as lembranças dos fracassos de Turco em playoffs se tornaram ainda mais fortes.

Todas, sem exceções, publicações do ramo — ou nem tão do ramo assim — dedicaram algumas linhas sobre o pífio histórico do goleiro canadense dos Stars, quando a grande dança começa — quase que como anunciando um novo desastre.

O adversário seria os Canucks, um oponente longe de ser considerado temível e que também contaria com uma grande interrogação na posição: como Luongo, tido como um dos mais promissores atletas da NHL, se sairia em sua primeira série de playoffs? Como todos os amigos já devem saber, ambos os goleiros roubaram a cena. Do jogo 1 até a derradeira 7.ª partida, vimos um espetacular duelo entre Turco e Luongo.

Na abertura, quatro prorrogações e um show do ex-guardametas dos Panthers. Canucks 1-0 na série. No jogo seguinte, o troco de Turco. Shutout, com algumas das 35 defesas sendo consideradas de alto grau de dificuldade. Os jogos 3 e 4 seguiram o equilíbrio e apertadas vitórias de 2-1 colocaram os Canucks em uma excelente posição para fechar a série em casa, no jogo 5. Turco frustrou os planos dos comandados por Alain Vigneault com um novo shutout — em uma partida que também deixou claro que o ataque do time canadense também está longe de ser o ponto forte do time.

Era preciso então vencer em Dallas. Seria algo normal caso a última vitória do time, atuando em seus domínios, não datasse dos playoffs de 2004. Mas Turco fechou novamente a porta. Terceiro shutout na série e os gols de Modano e Jeff Halpern forçaram uma improvável 7.ª partida.

Sem poder contar com Zubov e com o GM Place pulsando, os Stars tentaram fazer o que poucas equipes conseguiram na gloriosa história da NHL: vencer uma serie após estar com uma desvantagem de 3-1. Não aconteceu.

Joel Lundqvist até silenciou a arena com um gol no período inicial, mas um par de tentos, quando os locais estavam em vantagem numérica, significaram duas pás de cal na esperança texana. Daniel Sedin serviu seu irmão Henrik, que sozinho, e quando digo sozinho, quero dizer completamente a vontade, marcou o de empate no segundo período. Esse tento deu fim a mais de 165 minutos de invencibilidade de Turco.

No período final, Trevor Linden, também desmarcado, faria o gol da vitória. Em nenhum dos gols, Turco teve culpa. Os Canucks marcariam mais duas vezes com a rede de Dallas já vazia. Turco retornaria com poucos segundos restando. Mesmo com o brilhantismo exibido por Luongo nessa série, os números de Turco conseguiram ser ainda melhores que o do jovem fenômeno, mas, mesmo com o hóquei superlativo que exibiu nessa série, Turco sai do confronto contra Vancouver da mesma forma com que saiu em 2004 e 2006: eliminado na primeira fase.

Pelo menos se livrou daquela grande interrogação.

Eduardo Costa tem os melhores amigos do mundo.
Jeff Vinnick/Getty Images
Jon Klemm e Marty Turco foram testemunhas íntimas do gol de Trevor Linden.
Richard Lam/AP
Brenden Morrow tentou, mas Turco estava inconsolável. O goleiro pelos menos se livrou da pecha de amarelão em jogos de pós-temporada .
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Página publicada em 26 de abril de 2007.