Por: Cícero Josuélvson dos Reis

Manhã comum no Complexo Empresarial George Savalla Gomes. A redação de TheSlot.com.br, que ocupa oito dos nove andares do Bloco H, ainda está vazia, pois os primeiros raios de sol ainda não alcançaram as janelas do dormitório das strippers-escravas. A senzala de Jacy Borreaux está vazia, com a poble alma vagando pela América Central sob o patrocínio de Guatemaltecos Vagiclean. Baratas passeiam pelas caixas de pizza jogadas no chão e formiga atrás de formiga esbalda-se nas inúmeras gotas de milk-shake de Ovomaltine do Bob's que Alessander Laurentino derramou na reunião de pauta realizada na noite anterior.

Distraído com o balé das formigas, acabei chegando atrasado para colher o lixo do andar. Grande erro: um mendigo chegou antes de mim e vasculha de maneira insana o conteúdo. Não que haja grandes coisas lá, já que as dezenas de milhares de latinhas de cerveja esvaziadas semanalmente na redação são recicladas em processo industrial no Anexo B do complexo, o que garante o salário do diagramador barbudo que vive na masmorra. Pareceu-me estranho que o mendigo estivesse com um sobretudo em bom estado e um chapéu meio antiquado, mas ele poderia ter achado no lixo da cenografia do estúdio de cinema localizado no Bloco G.

Em sua busca frenética, ele não notou minha aproximação e tomou um grande susto quando eu já cheguei me impondo: "E aí, mano? Certo? Vamo vazá daqui!" Ele colheu um punhado de revistas de semanas anteriores e saiu correndo, berrando algo que não consegui compreender. Atrás de si, deixou uma trilha de revistas, quase todas a mesma edição: a número 166. Não foi difícil segui-lo.

Ele entrou em um Gol branco com placas do Paraná. O contador da revista me disse que provavelmente era um carro alugado. Estranho um mendigo ter grana para alugar um carro. Resolvi ir atrás. Peguei minha Variant 1974 (com logo da Audi na traseira e limpador de pára-brisas duplo) e segui-o. Quer dizer, até o carro morrer na Marginal Pinheiros — trânsito de três quilômetros atrás de mim em menos de 15 minutos, e ainda fui mencionado na Rádio Sul-América Trânsito. Tenho de me lembrar de passar no depósito da CET na semana que vem para pegar meu "carro" de volta. As multas atrasadas vão pesar no orçamento.

Felizmente, o horário de pico já estava no fim e consegui uma carona no lotação da linha Menininha–Pinheiros (no visor, lia-se "Minininha"). Tal qual um James Bond tupiniquim, berrei: "Siga aquele carro!" Fui, claro, expulso pelo cobrador. Acho que o episódio também teve a ver com o fato de meu Bilhete Único estar sem crédito.

Ainda bem que minha sorte não acabava: uns dois quilômetros à frente, uma Kombi acertou um motoboy, e o trânsito parou mais adiante, com o Gol branco entre dois caminhões pouco à frente. Deu um pique e parei ao lado do mendigo. De novo, ele não percebeu minha aproximação, tão concentrado que estava na leitura da matéria de capa do número 166. Quando fui falar alguma coisa, um motoboy passou por entre as faixas e me acertou. Vi estrelas.

Quando acordei, depois de, dizem, um passeio no helicóptero Águia da Polícia Militar, a Vanicleide estava ao meu lado. Parece que, como eu dei duas cambalhotas no ar e depois caí em cima do capô do Gol, alguém anotou a placa do veículo. A alma caridosa de Humberto Fernandes, meu chapa na virada de pinga no Bar do Zoinho, usou de todos os seus contatos para achar quem tinha alugado o carro naquele dia. Seus contatos, pelo visto, eram bem meia-boca, por isso ele só conseguiu o nome da empresa: Time Warner Company.

A informação não ajudou muito. Quer dizer, não ajudou até a última terça-feira, quando saiu o número mais recente da revista Sports Illustrated, publicada por essa mesma empresa. A matéria sobre hóquei foi claramente inspirada na nossa matéria de capa de oito semanas atrás! Ou seja: eu virei, ainda que involuntariamente e às custas de incontáveis hematomas e raladas, duas fraturas expostas e um braço quebrado, personagem de uma história de intriga internacional!

Quando eu contar em Cabrobozinho do Sul, não vão acreditar em mim!

Cícero Josuélvson dos Reis é faxineiro do Complexo Empresarial George Savalla Gomes e já teve uma carta publicada no extinto jornal Notícias Populares.

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Página publicada em 5 de dezembro de 2007.