Por: Marco Aurelio Lopes

Chris Dingman. Scott Parker. Mike Danton. Sean Avery. Blake Sloan. O que esses jogadores têm em comum? Além de serem no máximo medianos (para não dizer medíocres), todos eles entraram para a história da NHL ao terem seus nomes gravados na Copa Stanley, fazendo parte (de uma forma ou de outra), de equipes vencedoras do hóquei norte-americano. Mas como tudo na vida tem sua dose de injustiça, o esporte não é diferente, e jogadores infinitamente melhores, verdadeiros craques da NHL, que jamais tiveram a chance de estar em equipes campeãs, ou nem ao menos disputar um final de Copa Stanley. É justamente sobre um destes injustiçados que vamos falar hoje. Marcel Dionne, central que foi um dos maiores não só de seu tempo, mas de todos os tempos, que começou sua carreira em Detroit, encerrou-a em Nova York, mas onde fez sua fama em Los Angeles, onde foi o maior rei dos Kings por mais de uma década.

O nativo de Drummondville, Quebec, já era um fenomenal pontuador na equipe de sua cidade, ainda na Liga Junior de Quebec, que abandonou em 1969 para defender St. Catherines na Liga de Ontario, supostamente melhor tecnicamente. Essa mudança levou a um incidente histórico envolvendo Dionne e o técnico dos Remparts de Quebec (rivais de Drummondville), Maurice Filion, que prometeu vingança contra o time de Ontario — motivada também pela rivalidade histórica entre franco e anglo-canadenses. No entanto, ameaças contra o time de Dionne fizeram a equipe desistir de disputar a então Copa do Leste Canadense (hoje Copa Memorial) de 1971. Esse abandono fez por impedir os fãs de assistirem ao confronto entre os dois maiores jogadores junior da época, Dionne e Guy LaFleur.

LaFleur inclusive acabou sendo a grande sombra de Dionne, não só nos rankings amadores, como também na hora do recrutamento da NHL em 1971. Tanto que acabou sendo escolhido em primeiro naquele ano, pelo Montreal Canadiens, relegando Dionne à segunda escolha, que ficara com o também tradicional Detroit Red Wings, mas que atravessava um período difícil e não era mais um favorito perene à Copa Stanley, como nos anos 50. Mas Dionne mostrou logo em seu primeiro ano em Detroit que era realmente um jogador diferenciado, marcando 77 pontos em 78 jogos, estabelecendo um novo recorde de assistências para calouros, com 49 passes para gols. Neste ano inclusive, foi convocado para a Seleção Canadense que enfrentou os Soviéticos na "Summit Series" de 1972 — embora não tenha jogado na série; no entanto, Dionne ainda defendeu sua seleção na "Canada Cup" de 1976 e 1981 —, além de faturar o Troféu Calder como melhor novato da liga. Apesar de jogar em um time fraco como o dos Wings, Dionne nunca desapontou, e seus números confirmavam isso. Ano após ano, suas assistências aumentaram, e, em 1975, superou pela primeira vez os cem pontos na carreira, com 121, fruto de 47 gols e 75 assistências. Dionne era considerada a razão dos fãs terem algum motivo para acompanhar os Wings, do qual inclusive chegou a ser capitão, após a saída de Gordie Howe.

Porém, Dionne achava que já fazia por merecer salários maiores, para compensar as frustrações com as constantes derrotas. No entanto, o que não era esperado é que Dionne fosse encontrar alguém disposto a bancar seu salário em Los Angeles, onde o dono da equipe, Jack K. Cooke, interessado em atrair uma legião maior de fãs para a até então fracassada franquia, ainda em busca de afirmação desde sua criação, na expansão de 1967, ofereceu-lhe um salário de US$ 1,5 milhão por cinco temporadas. No que foi então o maior acordo da história da NHL, Dionne trocava as frustações e o vermelho de Detroit pela aventura e o amarelo de Los Angeles. E foi na costa oeste que Dionne realmente se consagrou, tornando-se o novo ídolo de uma cidade ávida por esportes, mas que até então só conhecia os Dodgers da MLB, os Rams da NFL e os Lakers da NBA, com quem os modestos Kings da NHL dividiam o sagrado Fórum de Inglewood. Foram doze temporadas em Los Angeles, e em oito delas Dionne foi o artilheiro dos Kings, em sete ultrapassou a marca dos cem pontos e em seis marcou pelo menos 50 gols. Junto com essas marcas, inúmeras outras nortearam a carreira deste central.

Começando em 1980, onde disputou palmo-a-palmo com um jovem de nome Wayne Gretzky pela artilharia da liga, e acabou vencendo o troféu Art Ross, com 137, tal qual Gretzky, mas tendo marcado um gol a mais (53 a 52). Em 7 de janeiro de 1981, seu 740.º jogo, marcou seu milésimo ponto (o mais rápido até então na história da NHL). No final do ano seguinte, seu 500.º gol, ao bater Al Jensen, dos Capitals, em um jogo no dia 14 de dezembro. Nesse tempo, Marcel foi o líder de uma linha com Charlie Simmer e Dave Taylor, centrando os dois ponteiros, e formando a "Tríplice Coroa", uma das mais famosas linhas daquela época, responsável pela grande maioria dos gols dos Kings, com os passes precisos de Dionne e um trabalho nas bordas não menos elogiável de Simmer e Taylor. No entanto, assim como em Detroit, Dionne jamais teve o gosto de estar em uma equipe vencedora, e, embora tendo alcançado os playoffs de 1976 a 1982, os Kings apenas passaram à segunda rodada em apenas três ocasiões, e jamais além disso, foram apenas 48 jogos de pós-temporada, sendo o mais inesquecível deles o famoso "Milagre em Manchester", onde os Kings reverteram uma desvantagem de 5 a 0 para o temido Edmonton Oilers, empatando o jogo nos últimos segundos e vencendo na prorrogação, para em seguida vencer a série. Naqueles playoffs, onde os Kings perderam na segunda rodada para o Vancouver Canucks, Dionne marcou 11 pontos em dez jogos.

Nos anos seguintes, no entanto, embora a produção de Dionne continuasse em um ritmo alucinante, os Kings não aproveitaram aquela virada histórica, e, nas cinco temporadas seguintes, apenas uma mísera participação nos playoffs (com mais uma prematura eliminação), em 1985. Dionne dava mostras de insatisfação com a falta de ambição dos Kings, do qual não era apenas um jogador, mas um torcedor da equipe. E durante a temporada 1986-87, quando os Kings apresentavam um promissor ponteiro de nome Luc Robitaille, que foi um pupilo de Dionne, este, sabendo da necessidade da equipe em se reformular, e após desentendimentos com o então treinador Pat Quinn, solicitou uma troca para uma equipe que fosse realmente capaz de lhe dar a sonhada Copa Stanley. No entanto, o que Marcel planejava era que o pedido forçasse o gerente geral Rogatien Vachon (um antigo ídolo King, que jogou junto com Dionne, a propósito), a reforçar os Kings. Mas a mensagem não foi captada, e Vachon acabou negociando Dionne com o New York Rangers — que à época era tão limitado quanto os Kings —, em uma troca que os torcedores de Los Angeles classificam como uma das piores da equipe em todos os tempos.

Os Rangers até chegaram aos playoffs daquele ano, mas assim como em Los Angeles, Dionne se despediu mais cedo, e o único jogo que disputou naqueles playoffs veio a ser seu último de pós-temporada. Foi mais uma frustração para ele, mas nem por isso seus números diminuíram. Foram 98 pontos em 118 jogos. Ainda em New York, Dionne chegou à sua 14.ª temporada de 30 gols (em 1988). Nesta temporada ainda alcançou mais duas marcas significativas. Em 31 de outubro de 1987, tornou-se o terceiro jogador na história a alcançar 700 gols. E em fevereiro de 1988, superou Phil Esposito para se consagrar como o segundo maior artilheiro da NHL (hoje é o quarto jogador com mais gols na NHL). Por fim, na temporada 1988-89, Dionne pôde jogar ao lado de Guy LaFleur, seu eterno rival nas estatísticas, que fora contratado pelos Rangers. No entanto, após 37 jogos, Dionne deciciu encerrar sua carreira, que ainda incluiu oito participações no jogo das Estrelas.

No dia 8 de novembro de 1990, a camisa 16 do "Pequeno Castor", como era conhecido, foi imortalizada pelos Los Angeles Kings, que o elegeu o segundo melhor central da história do time, atrás apenas de Gretzky. Em 1992, Dionne foi indicado ao Salão da Fama do Hockey, e seis anos depois, escolhido o 38.º melhor jogador da história pela revista "The Hockey News". A Arena de Drummonville foi rebatizada "Centre Marcel Dionne", e em 2004, o governo canadense o homenageou na série de selos "NHL All-Stars". Quando se aposentou, Dionne, com 731 gols e 1.771 pontos, só ficava atrás de Gordie Howe. Há quem o considere o maior jogador da história a jamais ter conquistado a Copa Stanley — curiosamente, seu irmão Gilbert, 19 anos mais novo que ele, tem seu nome na Copa, conquistada em 1993 com os Canadiens de Montreal. Certamente, uma das maiores injustiças do esporte, um jogador tão eficiente, regular e um favorito dos torcedores, além de um exemplo de conduta esportiva (como provam seus dois Troféus Lady Byng), não ter tido nem a chance de disputar um série final, nem sequer chegado perto. Seria o ponto alto, e literalmente, a coroação deste verdadeiro rei de Los Angeles.


Marcel Elphege "Little Beaver" Dionne
Central, Nascido em 03/08/1951 em Drummondville, Québec, Canadá.
1,77 m e 84 kg.

Carreira na NHL
Detroit Red Wings (1971 a 1975)
Temporada Regular: 309 jogos, 139 gols, 227 assistências, 366 pontos e 59 minutos de penalidades.
Los Angeles Kings (1975 a 1987)
Temporada Regular: 921 jogos, 550 gols, 757 assistências, 1307 pontos e 461 minutos de penalidades.
Playoffs: 43 jogos, 20 gols, 23 assistências, 43 pontos e 15 minutos de penalidades.
New York Rangers (1987 a 1989)
Temporada Regular: 118 jogos, 42 gols, 56 assistências, 98 pontos e 80 minutos de penalidades.
Playoffs: um jogo, um gol, uma assistência e dois pontos.

Títulos e Premiações:
Troféu Art Ross: um (1980)
Troféu Lady Byng: dois (1975 e 1977)
Prêmio Lester Pearson: dois (1979 e 1980)
Primeiro Time da NHL: dois (1977 e 1980)
Segundo Time da NHL: dois (1979 e 1981)
Indicações para o Jogo das Estrelas: oito (1975, 1976, 1977, 1978, 1980, 1981, 1983 e 1985)

Marco Aurelio Lopes foi almoçar depois desta matéria. E mandou avisar que na próxima semana tem mais um ídolo do passado nas páginas da TheSlot.com.br
Fonte: LegendsofHockey.net
4 temporadas em Detroit não foram suficientes para levar os Wings aos playoffs. O elenco não ajudava. Mesmo assim, ele mostrou que iria deixar sua marca na NHL.
Fonte: LegendsofHockey.net
Após sua temporada de estréia, Dionne passou a ser presença constante nas seleções canadenses.
Fonte: LegendsofHockey.net
Em 1975, a mudança para Los Angeles fez dele o maior artilheiro dos Kings, e um dos maiores da NHL, além de colocar a Califórnia de vez no mapa da liga.
Fonte: LetsGoKings.com
Entre Dave Taylor (esq.) e Charlie Simmmer (dir.), Marcel Dionne comandou a "Tríplice Coroa", linha ofensiva dos Kings nos anos 70 e 80. Seu ponto alto foi o "Milagre de Manchester", nos playoffs de 1982.
Fonte: LegendsofHockey.net
A camisa 16 de Dionne foi imortalizada pelos Los Angeles Kings, time pelo qual Dionne é um ardoroso torcedor, em 1990.
Fonte: LegendsofHockey.net
A mundança para o New York Rangers não era o plano de Dionne para chegar à sonhada Copa Stanley.
Fonte: LegendsofHockey.net
Ao lado de Bob Gainey (esq.) e Lanny McDonald (dir.), exibindo o anel de imortal do Salão da Fama do Hóquei, em 1992.
Fonte: OHLArenaGuide.com
Em 2004, a arena de sua Drummondville recebeu seu nome, passando a se chamar Centre Marcel Dionne.
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Página publicada em 18 de abril de 2007.